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Heróis da Resistência

02/06/2010

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Com primorosa mise-en-scene noir e extraindo atuações firmes, disciplinada e apaixonantes, o dinamarquês Ole Christian Madsen contextualizada a História na mitificação de Flame e Citron, dupla de assassinos que participou de inúmeras operações de sabotagem e execuções de informantes numa Copenhagen invadida pelos alemães de 1943 e 44.

Em Flammen & Citronen(2008), Madsen, coautor do roteiro baseado em fatos reais da segunda Guerra Mundial, assume um thriler de espionagem estilizado e pungente ao levantar a moralidade impura e a questão/conceito do heroísmo que cerca esses dois lendários membros de Holger Danske, grupo dinamarquês de resistência aos nazistas.

Enquanto o enigmático e taciturno Citron, Mads Mikkelsen, afasta-se cada vez mais de sua muler e filha, dominado pela austeridade e idealismo. O asseado ruivinho destemido, interpretado pelo carismático Thure Lindhardt, envolve-se com uma misteriosa mulher incerto da verdadeira relação com os nazistas. 

Membros do partido são expostos e assassinados denunciando a existência de um agente duplo. Informações plantadas e manipulações das ordens de execução expedidas pelo alto escalãoinflam um jogo de lealdade e princípios. A dupla segue, então, num plano autonomo de eliminar o chefe da Gestapo na Dinamarca enquanto o preço por suas cabeças está cada vez mais inflacionado.

Coco: bonitinha mas ordinária.

01/06/2010

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O romance de Coco Chanel, com o comerciante comerciante inglês Arthur “Boy” Capel, encontra trágico fim com a morte de Boy, aquele que a levou á Paris e investiu em sua primeira grife de chapéus, num acidente de carro. Essa passagem biográfica encerra o didático “Coco Before Chanel”(2009) com Audrey Tautou, de luto, desfilando sua primeira coleção e dá partida a produção art nouveaulesca de “Coco Chanel & Igor Stravinsky”(2009).

Era 1913, o compositor russo Igor Stravinsky estreou em pleno Théâtre des Champs Elysées  seu revolucionário e polêmico espetáculo. A rejeição foi generalizada, porém uma igualmente vanguardista espectadora sentiu verve como a modernidade do balé apresentado. Sete anos mais tarde foram apresentados.

A atração foi instantânea e elétrica. Influente, Chanel decide patrocinar a produção do novo balé e hospeda Stravinsky em sua residência em Garches, juntamente com sua esposa e filhos, para que ele tivesse um ambiente que o ajudasse a compor. As visitas de Coco eram constantes e os dois iniciaram um romance majoritariamente sexual.

Coco Depois de Chanel evoca os valores franceses: a elegância, a liberdade e a insolência, que, apesar de imperativa e imperialista, Anna Mouglalis veste de forma branda. Mads Mikkelsen prende-se a austeridade do compositor russo. A forte personalidade de dois ícones artísticos do século, é decorada por interiores art-deco estilizados, sons e imagens entregues pelo título e pouco diálogo, traduzindo um dúbio vazio em questionarmos este o encontro como um capricho temporário.

O affaire é ilustrado quase avulsamente á carreira da impiedosa dona da Maison Chanel e a confecção do icônico perfume Chanel nº 5, exceto pela fútil arrogância da personagem em presentear a enferma esposa de seu amante com um frasco do perfume, fato que culminou com a saída de Catherine Stravinsky e os filhos da residência Chanel. Construção e condução que ganham ares redentores no epílogo juntamente com a própria Madeimoselle, aos 88 anos, rica e solitária em sua suíte no Ritz, em seu derradeiro suspiro.

Deliciosamente incorreto

31/05/2010

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O prolífico roteirista de Stealing Rembrandt(2003), The Duchess(2008), Brødre(2004),  Brothers(2009), do vencedor na categoria melhor curta metragem este ano The New Tenants, e supervisor do Anticristo de seu conterrâneo Lars Von Trier, Anders Thomas Jensen assumiu as câmeras no ano de 2000 e embarcou em uma saga recheada de humor mordaz, diálogos ágeis e tão surreais quanto pertinentes e situações inóspitas com personagens amorais sitiados na zona rural de sua Dinamarca.

 Em Blinkende Iygter/Flickering Lights, um grupo de gângster foge com a grana de um mafioso e acaba no interior do país onde, com o passar das semanas, e vacas metralhadas no processo, o desejo de permanecer no local entra em conflito com o passado criminoso do bando. Três anos mais tarde, em De grønne slagtere/The Green Butchers, dois funcionários revoltam-se contra o patrão e tentam abrir seu próprio açougue, acidentes infortunosos coincidem com uma grande encomenda de carne e o negócio prospera.

Mads mikkelsen encerra sua participação na trilogia com Adams æbler/ Adam’s Apples“(2005), onde  interpreta um injustificável vigário, que personifica a passagem bíblica “dar a outra face”, encarregado de supervisar detentos num programa alternativo de liberdade condicional. O recém-chegado é Adam, um skinhead hostil, confrontado desde o primeiro dia pelo diabo em sua nova missão paroquial: a de confeccionar um bolo com os vistosos frutos da macieira.

Por sua vez, o neonazista confronta o comportamento inabalavelmente otimista do padre violentamente proporcional a revelações graduais dos outros  fiéis que buscam orientação do pároco: um cleptomaníaco com histórico de estrupro, um imigrante que rouba de multinacionais e uma grávida desequilibrada.

Em “Entre o Bem e o Mal”, optando pela gratuidade da violência e abordagem explícita de temas como pedofilia, paralisia cerebral, câncer, suicídio, holocausto e negação, Anders é capaz de orquestrar com um roteiro sagaz e extremamente bem humorado, diálogos tentadores e personagens desajustados e politicamente incorretos uma fita agradabilíssima.

 

Sobre Lord Voldemort, Le Chiffre e O Incrível Hulk

26/05/2010

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O que esperar de mais um blockbuster protagonizado por Sam Worthington e sua irrefutável ausência de humor ou carisma sem ainda poder contar com a qualidade imersiva dos recursos visuais tecnológicos que salvaram Avatar(2009)?

O arrebatador marketing do 3D,  integrado a fita após as filmagens encerradas em 2D, é um artifício a mais na lista de promessas não entregues por “Fúria de Titãs”(2010). Não há Titãns. Pelos menos, não os originais do monte Olimpo, aliás a assustadora criatura maligna prometida durante todo filme é emprestada da mitologia nórdica. Tampouco há Fúria. Num longa calcado e anunciado nos efeitos especiais, o uso dos óculos, a necessidade em pagar a diferença para recebê-los no início da sessão, se une ao um roteiro descalcificado na leviandade.

Como marionetes dos deuses de Hollywood, Sam Avatar é o bastardo semideus Perseu, curiosamente o único não transfigurado pelos maquiadores para o período helênico com cabelos e barba desgrenhados como Liam Neeson: um Zeus que, na condição de emburrado com a nova pretensão autônoma dos humanos, convoca para assustar os mortais seu irmão das trevas: Ralph Fiennes, como Lord Voldemort, quer dizer, Hades. Na verdade não só atores como também as criaturas e paisagens são como entidades emprestadas de “Harry Potter” e “O Escorpião Rei”.

Destaque para o crível guerreiro Draco, personificado com o charme e as, então reveladas, pernas finas do dinamarquês Mads Mikkelsen, o sisudo Le Chiffre de Casino Royale(2006), com a missão de incentivar Perseu a despeito de seu discurso teimoso. Os outros personagens apenas compõem uma dessaborida confusão polimitológica orquestrada por Louis Letterier, aquele mesmo que cinco anos após uma enxurrada de críticas negativas para o Hulk(2003) de Ang Lee, conseguiu executar um fiasco ainda pior com o re-remake de 2008, igualmente recheado de atores de linha justificando resultados vergonhosos com cachês astronômicos. Em “…Titãs“, Letterier consegue arrancar apenas bocejos durante a apoteótica evocação de Zeus para o releaseamento do Kraken: momento “ah, já tá acabando o filme”.

Vibração e curiosidade são propriedades exclusivas do trailler, apesar de não fugir a condição de compilação das cenas aproveitáveis de “Clash of Titans”, há um frenesi fugaz. A sincronia das batidas na trilha majestosa com as garras de um gigante escorpião aguilhoando contra o solo é particularmente emocionante.

Alice in Disneyland

25/05/2010

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É inegável o talento de Tim Burton para traduzir e construir mundos particulares (e peculiares) e ao assumir o comando da nova adaptação dos contos de Lewis Carroll, foi possível nos antecipar para um espetáculo visual recheado fantasia. Entregue. Os cenários surrealistas (de Carroll) e sombrios(de Burton) ainda receberam uma terceira dimensão que nos submerge juntamente com Alice no mundo mágico em “Alice in Wonderland“(2010).

O segundo talento de Burton, em delinear personagens marginais, que fogem a conveniências pré-estabelecidas, não apareceu no roteiro de Linda Woolverton (“A Bela e a Fera”(1991) , “O Rei Leão”(1994) e “Mulan”(1998)). Um tanto quanto confuso e superficial, a demanda dos padrões Disney, em oposição a aleatoriedade da viagem episodial de Alice contra o tédio.

Entre outros artifícios, Woolverton amadureceu Alice e entregou um tedioso prólogo para apresentar um dilema existencial para a protagonista. A nova Alice é agora uma adolescente libertária e feminista que confronta o uso do espartilho e questiona a decisão da mãe viúva em lhe arranjar casamento com um almofadinha, um tanto quanto repulsivo, conveniente para a família. É durante a cerimônia de noivado que Alice segue o emblemático coelho branco e retorna ao mundo onírico de seus sonhos de infância.

 Em meio a fraca combinação, e muitos beiram apenas a citação, de exóticos personagens dos distintos  Alice’s Adventures in Wonderland (publicado em 1865) e Through the Looking Glass(1871), a narrativa Disney impera e Alice ganha status de heroína com a missão de salvar o submundo do reinado da Rainha Vermelha de um monstro que facilmente poderia estar em Nárnia ou Hogwarts numa apoteótica batalha final da insossa Alice contra a fera, batalha que resume o longa: visualmente exuberante porém massacrado pela condução bestial- imperialista da estória e sua personagens alegóricas.

Nessa linha melindrosa entre o alegórico e o ridículo, segue a explicitamente forçosa Princesa Branca, mas, pelo conjunto da obra, a culpa não cai sobre Anne Hathaway pelos excessivos maneirismos, sua irmã má(!) é a Rainha Vermelha, que nos livros não é a que sentenciava compulsivamente as cabeças alheias, a de Copas. Apesar da falha é a única que invoca alguma curiosidade e simpatia do espectador, apesar de ser a vilã. E ainda os excelentes Crispin Glover, Stephen Fry e Alan Rickman como Valete de Copas, Gato Cheshire e a centopéia respectivamente, são igualmente minados pelas prioridades da superprodução:

Como o novo Chapeleiro, que passa por uma fonte da juventude para ganhar status de coprotagonista, numa versão completamente inacertada da doçura traumada de Edward (“…Mãos de Tesoura”) transvestida com uma peruca laranja latente, esbugalhados olhos verdes claros e dentes separados num resultado que facilmente se assemelha com uma Madonna a la Tim Burton. Além disso, Johnny Deep sujeita-se a um embaraçoso momento numa dança (break!) comemorativa que certamente deve agradar (somente) o público infanto-juvenil dos longas da Disney, e que ainda é repetido no epílogo por Alice quando retorna para a festa de noivado.

O inescrutável Sabor da Melancia

21/05/2010

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Em “What Time Is It There?”(2001), um vendedor de relógios de Taipei é tomado por um impulso de ajustá-los para o horário de Paris após uma venda para uma mulher em fuga para a capital francesa. Além de trechos de “Os Incompreendidos”(1959), Jean-Pierre Léaud, francês que interpretou o alteregóico Antoine Doinel nos filmes de Truffaut, faz uma participação no longa taiwanês.

 Outra menção de Ming-liang Tsai ao icônico cineasta parisiense é a conservação de mesmo personagem em seus filmes. Em 2005, o ex-vendedor de relógios,agora ator pornô, reencontra sua melindrosa compradora no musical erótico, por assim dizer, “The Wayward Cloud”.

Apesar de considerar certa alienação das premiações de Berlim depois de Tropa de Elite, concorrendo com Standard Operating Procedure, Zuo You, Hanami e There Will be Blood, a condição de Urso de Prata foi a principal referência para experimentar “O Sabor da Melancia”(2005) recentemente na Virada Gastronômica. 

Uma onde de calor e seca atinge a capital taiwanesa e em meio há um severo racionamento de água as apetitosas e hidratantes melancias estão supercotadas. Na cena inicial uma mulher deitada na cama sustenta o apetitoso fruto na virilha e um homem junta-se a ela em um ato sexual inter-reino e com alguns minutos a sala lotada já perde alguns espectadores. Instantaneamente me remeteu a um dos primeiros festivais que freqüentei, uma sessão de Anatomia do Inferno(2004) com Rocco Siffredi, nome que deixou de ser indiferente no início do primeiro tempo, quando fui eu que deixei a sala de projeção.

 Mas diferente do didatismo fisionomista de Catherine Breillat, o ménage com a melancia produziu mais risos do que asco, e já simpatizante do circuito asiático, eu, já não tão cinematograficamente pudica, condenei as pessoas que ceifaram a fita tão brevemente, e decidi que eles estariam perdendo. Logo, aviso, esta segue uma resenha indulgente.

E para quem estava disposto a experimentar (ou fazer uma ‘limonada’ e dar risada num madrugada fria de virada cultural), não era difícil extrair entretenimento (sem igual) nas bizarras e surrealistas passagens musicais que eventualmente rompiam a ausência de diálogos com performances cafonas, como a do protagonista que recorreu a uma cisterna para banhar-se e metamorfoseado num homem-lagarto cantava para a lua, teatrais, no drama coreografado da atriz pornô em forma de mulher-aranha ou extravagantes, com as performances musicais coletivas a la Busby Berkeley.

 Aliás, aos apontamentos metalingüístico na obra do diretor malaio soma-se o existencialismo e a premissa da incomunicabilidade de Antonioni, a escola cômica de Buster Keatone e, em especial nO Sabor da Melancia, o purgar de Vincent Gallo em “Brown Bunny”(2003). Ainda houve um momento tarantinesco com uma cena em que Hsiao-Kang traga o cigarro preso entre os dedos do pé de Shiang-chyi.

 Em meio a tantas alegorias, metáforas, recursos, e evasão progressiva do público durante a sessão, Tsai me convenceu a alternância entre a absurda comédia que transbordava das cenas explícitas e a comoção minimalista no tenro romance que acontecia paralelamente.  

 A questão evocada, acerca da real intimidade ou proximidade entre duas pessoas, desenhada de maneira inicialmente desajeitada e leviana até incomodamente pungente no literal gozo final não deixa de ser uma conferência da inescrutabilidade dos cineastas contemporâneos.

Ativismo ao curry

17/05/2010

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Em Nina’s Heavenly Delights (2006), a diretora Pratibha Parmar, queniana criada em Londres reconhecida por seu ativismo homossexual, constrói um romance lésbico no centro de um enredo gastronômico que se apresenta como uma sobremesa tão elaborada quanto uma salada de frutas.

 Com a morte do pai, Nina retorna a Glasgow três anos após fugir de um casamento arranjado com outra família de descendência indiana que atua no ramo da culinária Taj Mahal. Um a um, ela conhece segredos da família, endossados por  preconceitos étnicos e moralistas, enquanto assume a missão de conquistar o tricampeonato para o restaurante de seu pai em parceria com a namorada do irmão, por quem, entre uma fraterna guerra de farinha ou maliciosa degustação, se apaixona; mas diferente da mágica “química” entre temperos, o romance entre elas é tão saboroso quanto uma cestinha de pão.

 Com um ritmo insosso, especiarias tão exóticas como a repetição do mantra “siga seu coração” e corantes artificiais evocados da subtrama de seu amigo de infância, um travesti afetado e seus menudos que tentam uma participação numa produção Bollywoodyana e o indigesto programa temático que televisiona a disputa da gastronomia indiana em Glasgow, o que “Índia, Amor e outras Delícias” tem de positivo é a funcionalidade de figurar em ‘cardápio’ de filmes tanto de temática Culinária quanto GBLT.

Sobre misantropia e a Grande Maçã

23/04/2010

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Em seu retorno a Nova Iorque, Woody Allen também retoma seu facsímile no centro da trama com o protagonista deliberadamente alegórico, um físico teórico divorciado após uma frustrada tentativa de suicídio. Boris Yellnikoff entoa as predileções narcisistas do diretor, como a superioridade de Fred Astaire e Beethoven  ao barulhento rock moderno; encarna forçosos maneirismos e divaga para a câmera acerca da estupidez humana ostentando um já batido comportamento antipático e pessimista de uma figura recém saída de tirinha de jornal, como quando se dirige as crianças, seus alunos de xadrez, como amadores cretinos ou zumbis imbecis.

Para personificar seus performáticos solilóquios acerca da casualidade e entropia do cosmos, há outra manobra de Allen ao evocar o ethos do personagem do mesmo Larry David na série Curb Your Enthusiasm, que tem a oferecer “mau humor, hipocondria, mórbidas fixações, raiva recalcada e misantropia” a  jovem loira sulista Melody Celestino (Sra Marylin Manson) fugida para a Grande Maçã e encanta-se pelos discursos de uma persona quase indicada ao Nobel.

A orquestra de esteriótipos e clichês funciona com ocasionais boas linhas na dinâmica do improvável casal até que a mãe e pai de Melody apareçam e sejam instantaneamente reformados pela metrópole, de senhora alcoólatra e crente abandonada pelo marido à artista modernosa num relacionamento a três com outros dois intelectuais amigos de seu esclerótico genro, que, ainda que genioso (e genial?), não impede que ela ssuma uma missão cupido para a filha com um jovem e atraente aspirante a ator.

Com o dado de que o roteiro de Whatever Works(2009) foi escrito na mesma época de Annie Hall, aponta-se a condição irascível do rabugento que habita a alma de Allen há mais de trinta anos e encerra o momento de seu bem elaborado passeios pela austera sofisticação de Match Point(2005) e Cassandra’s Dream(2007) ou a sensualidade de Vicky Cristina (2008) e até a espirituosidade de Scoop(2006) para sua fórmula que (Tudo) pode dar certo exclusivamente para os afficionados pela persona de Woody Allen transbordando durante 90minutos.

Adam Elliot e suas síndromes.

10/04/2010

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O diretor e roteirista australiano Adam Elliot, da animação “Harvie Krumpet” (2003) premiada com Oscar de melhor curta, retoma sua combinação de fantasia mordaz em claymation (animação feita com moldes de argila) para traçar vinte anos de um improvável amizade no conto sincero e sombrio “Mary and Max”(2009).

Mary é uma menina australiana de 8 anos de idade, solitária, com uma marca de nascença na testa, negligenciada pela mãe alcoólatra e o pai viciado em seu hobby. Certa vez, ela acabou por sortear um nome num livro dos correios e escreveu para um endereço em Nova Iorque para perguntar se os bebês na América também surgem no fundo de canecas de cerveja como sua mãe contou. Em outro continente, o destinatário Max de 40 anos tem em comum com sua nova amiga de correspondência a solidão e a admiração pelo desenho televisivo The Noblits e chocolate.

Na troca de cartas, Mary confidencia detalhes de sua rotina como o bullying que sofre na escola e o conforto que encontra em uma lata de leite condensado enquanto Max revela seus três objetivos na vida: conseguir a coleção completa de bonecos dos Noblits, ter uma fonte de chocolate e encontrar um amigo.

A sombria cenografia compõe o teor melancólico do conteúdo das cartas, das fatalidades, neuroses, feridas, frustrações e desencantos que acompanham os anos seguintes até que a jovem Mary possa dividir com seu amigo um breve momento de sucesso com seu casamento e a publicação de um livro sobre a condição neurológica da qual Max é acometido, a síndrome de Asperger (o protagonista de seu Harvie Krumpet também possuía um transtorno psiquiátrico que moldaria sua vida, no caso síndrome de Tourette), porém as histórias de vida antes independentemente descritas tornaram-se diretamente afetadas mutuamente pela excêntrica amizade de Mary e Max.

Um elemento de repetição e morbidez emanam na segunda parte da animação, acompanhados de elementos mais pesados como ansiedade, suicídio, alcoolismo, morte e abandono e já não há lugar para um peculiar humor que permeava as dificuldades de ambos inicialmente, ainda assim “Mary e Max: Uma amizade Diferente” consegue atingir uma sinceridade ímpar e a dublagem pujante dos atores Toni Collette, Philip Seymour Hoffman, Eric Bana e a narraçao do comediante australiano Barry Humphries resultam numa obra muito além de um simples stop-motion com belíssima direção de arte, há vida e feridas reais . Escolhido para a noite de abertura de Sundance 2009 é citado ser baseado em fatos reais, e numa entrevista Adam Elliot afirmou ter se inspirado em seu amigo ‘de correspondência’ novaiorquino. Sinistro.

The U.S. vs todo o resto!

02/04/2010

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Membros do governo dos Estados Unidos, advogados e pessoas próximas ao casal Yoko e Lennon, intelectuais como Gore Vidal e Noam Chomsky e alguns líderes ativistas dos anos 70 compõe uma série de depoimentos que agrega o documentário de David Leaf e John Scheinfeld.

The U.S vs John Lennon”(2006) descreve como um músico/artista chegou ao ponto de perturbar o governo Nixon em vigor, ter seus direitos violados por escutas telefônicas ilegais, perseguido pelo FBI e entrou em uma briga de quase cinco anos com as constantes investidas do Serviço de Imigração americano para deportá-lo.

O documentário abre com entrevistas dos Beatles em que destacam o poder da voz de John Lennon e sua plena consciência do alcance de suas palavras e escolha por uma responsabilidade de transmitir uma mensagem acerca da guerra que acontecia no Vietnam ao invés de limitar-se a música. Nesse momento os roteiristas infiltram imagens de jovens soldados mortos, estatísticas e relato de um veterano paraplégico.

Um ponto definitivo na vida de Lennon foi o encontro com a então artista conceitual Yoko Ono e o efeito libertário dessa união para seus ideais. Agregou o tom performático e tentava ilustrar seus conceitos como bagismo e “comunicação total” para os céticos jornalistas que incessantemente acompanhavam o casal, e assumiram uma postura conjunta e exibicionista para transmitir a paz e a relação direta com as novas canções que levava multidões a entoarem “Give peace a chance”, canções que denunciava para os inimigos e conservadores seu comportamento subversivo.

A posterior associação do casal com radicais de movimentos paralelos como Panteras Negras, é contada pelos roteirista relevando um caráter ingênuo de John e o colocam como joguete político dos ativistas dos quais ele financiava a ideologia e outras polêmicas envolvendo o uso de drogas ou elemento negativo para a figura de John Lennon não são tratados. Há certamente um peso do sentimentalismo e complacência de David Leaf e John Scheinfeld.

Como um filme que poderia levantar questões acerca dos maniqueísmos de um governo beligerante e a repercussão frustrada das vozes opositoras de frente ao imperialismo estadunidense nos dias atuais, “Os E.U.A. vs John Lennon” é uma boa saudosista biografia.

Sede de vampiros sedutores

01/04/2010


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Pois os vampiros vieram com tudo mesmo, da série True Blood, passando por essas adaptações de livros, e até mesmo Willem Dafoe e Ethan Hawke protagonizaram um longa com essa temática, Daybreakers(2009), ainda sem previsão de ser lançado no Brasil. E no ano de 2009, vampiros chegaram até Cannes pelas lentes do cultuado Chan-Wook Park, e levou prêmio do Júri por “Sede de Sangue“.

Nessa versão sul coreana, um padre voluntário no desenvolvimento de uma vacina recebe uma transfusão e é o único curado dos sintomas da doença fatal, e acaba atraindo uma legião de fiéis em busca de curas para outras tantas efermidades. Essa é a primeira parte do filme.

Na busca de salvação através do padre milagroso uma mãe procura cura para seu filho acometido de um cancêr, que foi amigo de infância do padrevampiro, e este passa a conviver em sua casa como nos tempos de infância e descobre os prazeres da carne com a esposa do conhecido numa tensão entre o “desespero e a depravação”. Esta é a segunda parte.

Em seguida, Bakjwi/Thirst (2009) passa a ser uma tragicomédia romântica onde os protagonistas tem sede de sangue e precisam se entender como casal, que retoma, nos doces momentos de Mido e Dae-Su de “Oldboy“(2003).

A fita tem cinematografia bem acentuada, divertido, mas arrastasse por entre esses ápices conclusivos sequidos por outra sequência de acontecimentos. Porém, pessoalmente, o ‘defeito’ maior do filme é mesmo a associação vampiresca com uma doença de ascos sintomas quando sou  a favor dos bons e velhos imortais  sedutores e sofisticados, como em “Entrevista com Vampiro” (1994).

Amelia é que era mulher de verdade!

30/03/2010

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Recheado de esmero, “Amelia”(2009) é uma biografia tediosamente morna. A história da aviadora do Kansas que foi a primeira mulher a cruzar o Pacífico e desapareceu durante a empreitada ao redor do mundo, parece ter sido reduzida a uma pequena ficção ordinariamente motivadora com frases de efeito como “quero ser livre” e que o céu é “um lugar bonito, simples, seguro, onde tudo é compreensível”.

A escalação de Hilary Swank foi um acerto, com sua aparência andrógina, os dentes grandes e o mesmo cabelo picotado compõem a figura legendária dos anos 30, mas apesar de sua personificação de Amelia Earheart, o roteiro falhado e sem ritmo apresenta uma protagonista muito esperta e assertiva, inicialmente insegura com seu corpo, a razão de usar calças masculinas, e intimidada pela figura do impassível editor George Putnam(Richard Gere), que posteriormente assume a figura de marido dedicado, complacente e, ao mesmo tempo, um eficiente relações-públicas, a transformando em queridinha da América e ícone de publicidade, emprestando seu nome para linhas de malas, por exemplo.

A própria Amelia também não é consistente, uma vez ousada e perseverante, uma feminista fervorosa, acaba esbanjando arrogância, “sou uma aventureira brilhante”, e teimosia e até imprudente no que diz respeito as condições de segurança em seus vôos.

Uma potencial subtrama, de outra talentosa jovem aviadora ( a “Alice”, Mia Wasikowska) que ameaça o status de Earherat é abruptamente retira de cena para dar lugar a implicações de um caso extraconjugal com o empresário da aviação Gene Vidal (Ewan McGregor), se a motivação era física, a química não funcionou, McGregor está plástico e inexpressivo como um figurante.

As falas beiram o formalismo e os diálogos transbordam em placidez, até mesmo quando seu marido e amante estão sob o mesmo teto, não há tensão. A diretora indiana Mira Nair (do mais recente Nova York, Eu te Amo) entrega um filme sem emoção, composto por repetidas imagens de sua perspectiva aérea como as as savanas africanas, por exemplo, e permeadas por acontecimentos de sua vida pessoal de forma tão morna como citações biográficas pontuadas.

xarope indie

30/03/2010

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Um pequena fábrica de extrato (xarope de amêndoas  para recitas caseiras de bolos e doces) tem como corpo de funcionário estereótipos como: um roqueiro acéfalo conduzindo a empilhadeira, alguns imigrantes latinos que não falam inglês, um caipira com aspirações a gerência, uma dupla de senhoras futriqueiras e queixosas, um gerente impassível e o dono boa-praça, que apesar do sucesso financeiro, logo nos apresenta sua dinâmica pessoal: chegar em casa antes que a mulher vista as calças de moletom, circunstância sentencial para a possibilidade de algum romance.

Assim, quando a esposa desmerece suas investidas pelo programa que vai começar na TV, Joel segue para despejar suas frustrações no bar do seu melhor amigo, Dean, que possui um arsenal de medicações tarja preta e acredita que elas resolvem qualquer problema.

Paralelamente conhecemos  uma jovem que usa sua beleza em pequenos e bem sucedidos trambiques e um acidente em cascata na fábrica, leva a bela golpista (Mila Kunis de That Seventies Show) a tornar-se funcionária temporária de Joel, que divide o dilema entre o morno casamento e o flerte com a nova funcionária no balcão do bar na mesma noite em que aceita as pílulas milagrosas de Dean e o resultado é o plano de contratar um gigolô para seduzir a esposa, se ela o trair primeiro, o caminho está livre para ele sucumbir. Porém o plano, como é de se prever, não sai como o combinado.

Com atmosfera e atores ícones da cena indie como o protagonista Jason Bateman, o “pai da Juno” J.K. Simmons, Beth Grant, o roteirista de diretor Mike Judge ( de Beavis e Butt-Head ) assume “Extract” (2009) com tons de sitcom com direito a convidados ilustres como Gene Simons na pele de um circense advogado do povo e o mainstream Ben Affleck com aparência duvidosa fazendo um papel secundário com o melhor amigo drogado e imaturo de Joel. E a boa e conhecida fórmula triunfa mais uma vez com um bom roteiro leve, composto de pequenos desastrados e divertidos acasos e a presença magnética do elenco.

O milagre das ovelhas e tulipas

29/03/2010


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Tulpan(2008) emerge de um realismo social da singular rotina da vida nômade nas estepes do Cazaquistão, mas, a maneira como este lirismo etnográfico compõe a estória do romântico e lúdico Asa, faz desta produção uma experiência cinematográfica ímpar mais que agradável.

Na cena de abertura, um jovem vestido com uniforme de marinheiro discorre entusiasmadamente sobre os hábitos predatórios de um polvo gigante, para uma platéia nada comovida. Ele está tentando impressionar os pais e por trás de uma cortina, a enigmática jovem Tulpan. Ele está acompanhado de um carismático comerciante e o austero cunhado. A exigente Tulipa é sua única opção de futura esposa no raio de um dia de viagem de carro, e Asa, da forma mais pura e inocente, se apaixona pela garota de quem apenas via as mãos.

Depois de cumprir serviço naval, nosso singelo protagonista está morando com a dedicada irmã e seus três filhos pequenos, que ganham espaço merecidíssimo no longa, e tenta desastradamente seguir os passos de seu marido, um pastor de ovelhas. A rotina árida e a paisagem desolada, diferente de seu amigo que está sempre tentando convencer Asa a procurar emprego na cidade,  é cenário para seu oásis, com um grande rebanho, uma esposa e uma yurt (espécie de tenta reforçada) bem decorada sob o céu estrelado da estepe cazaquistanesa.

Asa é um rapaz doce, demonstra-se um romântico irrecuperável sempre pensando em Tulpan durante os intervalos em que tenta ajudar o cunhado com o problema que tem assolado a família, as crias natimortas do rebanho, resultada em uma cena bela e visceral em Asa assiste uma ovelha durante um difícil parto, de forma documental como na produção alemã de 2003 rodada na Mongólia Camelos Também Choram, mas a presença e a pureza de Asa constróem na tela um pequeno e cativante milagre, são esses milagres cotidianos captados tão carinhosamente pelas lentes de Sergei Dvortsevoy que pode ser estendido para traduzir essa modesta e ao mesmo tempo grandiosa fita. Levou Un Certain Regard em Cannes 2008.

Uma cabeçada na parede

29/03/2010

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A história das tentativas do exército dos EUA de potencializar poderes psíquicos para criar super-poderes, como atravessar paredes e fazer o coração de uma cabra parar apenas a encarando, é o pano de fundo para uma presumida comédia que ironiza a guerra do Iraque e os ideais do militarismo americano assume ares de grande estupidez em “Os Homens que Encaravam Cabras”(2009).

Um sargento (o mesmo ator no semelhante esteriotipado sargento de Avatar) levanta-se se sua mesa, atravessa a sala correndo e dá com a cabeça na parede, numa cena de abertura que pretty much resume o que está por vir. Ewan McGregor é um jornalista que acaba de ser trocado pela namorada pelo editor do jornal onde trabalha, um sujeito nada atraente e com braço mecânico(?), e decide encontrar um rumo para sua vida, “uma missão”, esta, que lhe cai no colo ao encontrar um veterano do Vietnã, um personagem meio pateta meio lunático de George Clooney.

Aos poucos Clooney relata em flashbacks a formação e treinamento da então, recém-criada, divisão Nova Era do exército, liderada por um new-hippie Jeff Bridges, que usa nomenclatura Jedi para seus soldados prodígios. Na academia de adivinhações regadas a LSD, o personagem arrogante porém sem talentos psíquicos aguçados de Kevin Spacey quer usar os fundamentos paz e amor dos supersoldados monges para “O Lado Negro”.

Se alguma intenção apologética de satirizar a guerra colocando um elenco de primeira semiretardado pelo efeito de ácido lisérgico funcionou para alguém, esse alguém certamente não fui eu.

A história das tentativas do exército dos EUA de potencializar poderes psíquicos para criar super-poderes, como atravessar paredes e fazer o coração de uma cabra parar apenas a encarando, é o pano de fundo para uma presumida comédia que ironiza a guerra do Iraque e os ideais do militarismo americano assume ares de grande estupidez em “Os Homens que Encaravam Cabras”(2009).

Um sargento (o mesmo esteriotipado sargento de Avatar) levanta-se se sua mesa, atravessa a sala correndo e dá com a cabeça na parede, numa cena de abertura que pretty much resume o que está por vir. Ewan McGregor é um jornalista que acaba de ser trocado pela namorada pelo editor do jornal onde trabalha, um sujeito nada atraente e com braço mecânico(?), e decide encontrar um rumo para sua vida, “uma missão”, esta, que lhe cai no colo ao encontrar um veterano do Vietnã, um personagem meio pateta meio lunático de George Clooney.

Aos poucos Clooney relata em flashbacks a formação e treinamento da então, recém-criada, divisão Nova Era do exército, liderada por um new-hippie Jeff Bridges, que usa nomenclatura Jedi para seus soldados prodígios. Na academia de adivinhações regadas a LSD, o personagem arrogante, porém sem talentos psíquicos aguçados, de Kevin Spacey quer usar os fundamentos paz e amor dos super-soldados monges para “O Lado Negro”.

Se alguma intenção apologética de satirizar a guerra colocando um elenco de primeira abobado pelo efeito do LSD funcionou para alguém, esse alguém certamente não fui eu.


Una limonata, per favore!

26/03/2010

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O pacato Gianni é um filho dedicado integralmente a sua exigente nonagenária mama. As vésperas do dia da Assunção, em 15 de agosto,  na irremediável condição de endividado, ele aceita cuidar da mãe do síndico durante o feriado na intenção de que ele alivie a pressão dos outros condôminos a respeito da dívida de seu aluguel, já acumulada há anos.

No dia seguinte recebe como hóspede  não somente a espaçosa Marina mas também uma segunda senhora, tia Maria. E antes que o dia acabe, recebe a visita de seu médico, que durante uma cordeal consulta também acaba coagindo-o para cuidar de sua mãe no mesmo período. Gianni agora, além dos caprichos de sua matrona, precisa zelar pela alimentação, e algumas restrições, e medicação de suas novas hóspedes. Divide-se entre a preparação dos cômodos, das refeições, a disputa interna pela televisão e o distinto temperamento das viúvas.

Em contraste com a posição de fardo que essas senhoras podem assumir para seus filhos, está a generosa afetuosidade e paciência de Gianni, que tem em suas idas ao armazém, um momento para tomar um vinho na companhia de um conhecido enquanto trocam sentenças despretensiosas a respeito do tempo e da fuga dos moradores da cidade durante o ferragosto. Gianni nunca reclama mas mantém firme a perspectiva no prazo acordados com os respectivos filhos de suas hóspedes.

Com uma encantadora premissa da máxima dos limões e limonadas da vida, o intimista e agradável encontro de viúvas em “Pranzo di Ferragosto”(2008) tem conquistado não só o público mas principalmente os críticos mundo afora. Além de três prêmios em Veneza 2008, conquistou o Satyajit Ray Award no Festival de Londres. Vale contar que o prolífico cineasta indiano Satyajit Ray, então publicitário, foi fisgado pelo neorealismo de Ladri di Biciclette (1948), que marcou sua sólida carreira retratando situações do cotidiano em locações naturais e utilizando atores desconhecidos.

O roteirista italiano Gianni Di Gregorio, que estrela e dirige o parcialmente autobiográfico Almoço em Agosto, certamente foi merecedor deste prêmio em particular (anualmente concedido para a fita “que melhor capta a arte expressa na visão de Ray”) uma vez que, além ter sido rodado num apartamento que pertence a sua família, Gianni convocou uma tia, uma amiga e duas senhoras num asilo para comporem seu elenco.

A parceria bem sucedida com o diretor do aclamado Gomorra(2008), da qual Di Gregorio foi roteirista, é repetida. Seu conterrâneo Matteo Garrone assina a produção de ...Ferragosto, lançado este mês nos cinemas norte-americanos e reproduzindo o sucesso com a crítica  sob título de Mid-August Lunch.

Did you hear about Carrie Bradshaw?

26/03/2010

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Um rico advogado e uma igualmente bem sucedida agente imobiliária formam o casal Paul e Meryl Morgan, atualmente separados devido à infidelidade de Paul que, arrependido, tenta a reconciliação insistentemente ao ponto dela aceitar um jantar juntos.  Após saírem do restaurante acabam por testemunhar o assassinato de um cliente dela, que descobriria-se ser um traficante.

Ameaçados pelo mesmo assassino, tornam-se testemunhas do estado e são transferidos para a rural Wyoming sob nova identidade e proteção de um policial local e sua esposa. Todos os estereótipos dessa mudança persistem, como o fato da vegetariana Meryl deparar-se sob supervisão de um casal de caçadores, que tem cabeças de animais na decoração da casa e um cardápio igualmente repulsivo para seu título de “pessoa para tratamento ético dos animais”.

Em meio a nova rotina com direito a cavalgadas, confronto direto com ursos, dança country, chapéus e rodeios interioranos, o casal há de se reapaixonar com toda previsibilidade e skits manjados e ninguém espera diferente, porém a dicotomia Manhattan-Wyoming evoca exaustivamente a mesma devoção fervorosa ao estilo novaiorquino de ser e vestir, uma leve variação da mesma Sarah Jéssica Parker em Sex and the City. O personagem de Hugh Grant, apesar de um vermelho bronzeado muito estranho, ainda possui um maneirismo com ares de comédia e algumas falas espertas em meio a insipidez generalizada em “Cadê os Morgans ?”(2009), uma comédia romântica que é tampouco engraçada quanto romântica.

Soul Kitchen

24/03/2010

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A comédia pode aparecer em doses triviais como uma cena de ereção numa sessão de quiropraxia ou um tropeço desastroso durante um funeral, mas em se tratando do garbo de Fatih Akin, só podemos acusar seu “Soul Kitchen”(2009) com o eufemismo de espirituoso, até porque, na maior parte do tempo, é.

Depois dos densos dramas anteriores Contra a Parede(2004) e Do Outro Lado(2007), o prolífico diretor alemão de origem turca nos leva a uma Hamburgo contemporânea, jovem e miscigenada, e consegue transferir a sensação de conforto que ele próprio nutre com o cenário em viveu por muitos anos. Esse saboroso elemento intimista funciona bem com o público bem com júri de Cannes, que lhe conferiu prêmio em 2009.

No roteiro, um jovem alemão de origem grega, dono de um restaurante ‘de beira de estrada’, vê a bela namorada partir para uma longa temporada em Xangai no mesmo período em que seu irmão sai em condicional(rosto familiar de Corra Lola, Corra), agentes sanitários o pressionam, assim como um mal intencionado colega de infância, um tempestuoso chef (o protagonista de Contra a Parede) assume o cardápio de seu restaurante e um pequeno acidente o leva a um consultório de quiropraxia.

Esta sincronia de infortúnios, os rostos de atores conhecidos e a atmosfera calorosa apresentada por Akin criam um clima descontraído e facilmente nos envolve (da mesma maneira convidativa que faz aos novos clientes) durante a transição de Soul Kitchen à um lugar aconchegante, badalado, que seduz seus freqüentadores descolados com alta gastronomia e uma agradabilíssima trilha de soul e funk, marcada por uma noite, particularmente extravagante, que demarca o clímax do filme, sucedido por uma sequência bem morna de reviravoltas e desencontros que só retoma o sabor brevemente nos estilosos créditos finais.

Zatôichi meets Mad Max em Alcatraz

24/03/2010

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Na mesma semana que estréia um filme sobre os dilemas de Charles Darwin acerca do impacto de suas evidências evolucionistas numa sociedade moldada em princípios religiosos, outro lançamento é um blockbuster que postula um homem cristão como seu herói. Talvez o cientista não tivesse perdido tantas noites se soubesse que 150 anos após a publicação de suas descobertas, o mote de um andarilho protegendo o último exemplar de um livro sagrado seria um campeão de bilheteria.

Denzel Washington é um homem solitário atravessando uma vasta paisagem estéril resultante de uma catástrofe global. Carrega consigo uma mochila e uma espada diariamente afiada e quando encontra hostil companhia de saqueadores e canibais demonstra que definitivamente sabe usá-la. A primeira metade de “The Book of Eli”(2010), com a poderosa presença de Denzel sobrevivente numa excelente cinematografia carbonizada e desértica, é bastante promissora, mas tão logo encontre uma versão faroeste pós-apocalíptica de Mad Max as coisas mudam.

As poucas regras nesta anarquia mad maxiana, que conta com violentos motoqueiros empoeirados, são impostas por Carnegie (não o melhor vilão de Gary Oldman), que tem como único objetivo encontrar o livro que é capaz de “ordenhar” as pessoas e dominar o mundo. O mesmo livro que, pasmem, está na mochila do forasteiro; mas Carnegie ainda não sabe disso quando o convida a passar uma noite no saloon na companhia de sua enteada, a that seventies show Mila Kunis, que munida de estilosos aviator agrega outra repetida sequência slow motion de Eli em sua fuga pelo deserto.

Os irmãos Hughes, de From Hell (2001), acabam por entregar um excelente conto americano: superficial, alegórico e com um pesado arsenal de armas de fogo e muita, mas muita munição, sem abandonar as ideologia cristã;  a cereja do bolo: um final profético em Alcatraz. tsc tsc

Charlize Theron e Kim Basinger No Deserto

21/03/2010

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The Burning Plain“(2008) é mais uma obra fragmentada do roteista Guillermo Arriaga [Amores Perros(2000),21 Gramas(2003), The Three Burials of Melquiades Estrada(2005) e Babel (2006)], de escrita emocionalmente elaborada e  sequências trabalhadas no visual desértico da fronteira México e Eua, que depois de uma bem sucedida parceria com o diretor também mexicano Alejandro González Iñárritu, assume ineditamente as câmeras sob melindroso limiar de auto-indulgência e autoria.

Em “Vidas que Se Cruzam”, Charlize Theron é uma mulher visívelmente danificada, entre um cigarro e outro e sexo casual com diferentes homens, ela tira uma pausa em seu trabalho para se automutilar. Ela está sendo seguida por Carlos, a quem, sem saber os motivos de seu interesse, imediatamente oferece sexo.

Paralelamente conhecemos a adolescente Jennifer no momento que descobre o adultério da mãe, a pacífica e amorosa Gina (Kim Basinger), que enfrenta um dilema entre a recente paixão correspondida por Nick e o desconforto de sua feminilidade comprometida após a retirada de um câncer de mama. O trailer que servia de cenário para os encontros extraconjugais explode e a morte do casal evidencia o relacionamento e as duas família entram em confronto enquanto,  à  moda Shakespeare,  Jennifer e o filho de Nick desenvolvem uma relação muito diferente do ódio.

Em outro fragmento, um piloto de monomotor que pulveriza fazendas no Novo México sofre um acidente sob o olhar se sua filha. No decorrer do filme as peças lentamente se encaixam evidenciando a conexão direta entre as personagens e as raízes de suas angústias com uma proposta final redentora à la Arriaga.

Creation

19/03/2010
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A obra `A Origem das Espécies` de Charles Darwin, publicada em 1859, tem sido chamada de a maior idéia original na história do pensamento. Esta é a história de como foi escrita”.

Elucidamente anunciado por esta citação inicial, “Creation”(2009) mergulha na pesquisa individual do cientista sob uma ótica da complexidade temporal e o dilema moral, focada em sua devotada relação com a primogênita e precoce Annie.

No roteiro, baseado no livro “Annie`s Box”, escrito após o autor Randal Kyenes, tataraneto de Darwin, encontrar uma caixa com alguns pertences de Annie, Darwin aparece em seus quarenta anos, recluso e melancólico, com a saúde fraca, profundamente preocupado com a propagação dos resultados de sua pesquisa em uma sociedade fundamentada no cristianismo, assim como a resposta de sua religiosa esposa a uma guerra que Darwin trava com Deus, “da qual ele não pode ganhar”, nas palavras de Emma Darwin, numa interpretação duvidosa de Jennifer Connelly. Quem triunfa é seu marido (também na vida real) Paul Bettany.

Em flashbacks, ele aparece relatando trechos de sua viagem a bordo do Beagle, em especial sua passagem pela Argentina, para sua vívida e curiosa ouvinte, que demonstrava precoce interesse e prodígio entendimento pelos estudos do pai. Paul e a pequena (e notável) Martha West atingem uma sincronia e afeição intensa e espontânea em uma demonstração espetacular de profunda e tão especial conexão filial; simples olhares transbordam em admiração mútua capaz de nos atingir com uma real sensação de luto e pesar por sua morte aos dez anos de idade, tragédia que devastou igualmente a saúde e psique de Darwin. É preciso dizer que qualquer burburinho que já se tenha ouvido sobre uma interpretação mirim não é concorrência para Martha como a Annie.

Sua morte também foi definitiva para romper sua crença e culpa com a Igreja, enquanto sua esposa buscou refúgio nela, um abismo foi aberto entre o casal, principalmente pelo fato de que eram primos de primeiro grau e culpava-se pela direta e conhecida relação entre o parentesco próximo e a debilidade da Annie. Darwin torna-se, então constantemente assombrado e confortado pela presença póstuma da filha.

Algumas digressões de teor científico são ricamente ilustradas pelo diretor inglês Jon Amiel nesta cativante e sensível biografia do ilustre Charles Darwin apoiada em exímia competência na edição, direção de arte, na comovente trilha sonora de Christopher Young, que poderiam ter composto uma fita impecável não fosse a escalação de Jennifer Connelly. Ainda assim, não é motivo para “Criação” ter sido tão subestimado, é necessário lembrar que (absurdas) correntes criacionistas tem seu espaço, inclusive defendida por figuras políticas dos EUA e Reino Unido.

para os aficionados por Darwin e (certamente) pelo filme recomendo o site oficial http://creationthemovie.co.uk/

The Blind Side

18/03/2010

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Baseado na não-ficção homônima de Michael Lewis, a improvável história de Michael Oher passa por dois momentos definitivos: o pai de um amigo convence o treinador de um tradicional colégio cristão a matricular os meninos para aproveitar seus dotes como esportistas; é lá estudam os filhos da família Tuohy, que viria a ser sua futura família.

Sandra Bullock está incorrigível no papel da matriarca Leigh Anne, ex-líder de torcida, sulista, republicana, esposa de um jogador de basquete aposentado e dono de uma cadeia de franquias. Tim McGraw, que já atuou em outro drama de futebol americano Friday Night Lights(2004), faz o marido cúmplice e carismático, que apóia a decisão de Leigh Anne em abrigar o famigerado e sem-teto Big Mike numa noite fria, e todas as que se seguiram. É a família Tuohy, aficionada por esportes, que impulsiona Michael a aperfeiçoar seu talento para o futebol quando ele nem conseguia assimilar as regras do jogo.

Sem grandes reviravoltas mas nem por isso menos envolvimento e torcida por parte do espectador, John Lee Hancock opta por não explorar visualmente a infância traumática com a mãe viciada em drogas e passagens por lares adotivos, essas informações são entregues em diálogos, deixando espaço para a emocionante jornada de Mike a partir de sua entrada como semianalfabeto em Wingate, uma batalha acadêmica para garantir uma bolsa de estudos em uma faculdade com objetivo de jogar profissionalmente ao comovente epílogo com imagens reais da entrega do prêmio da NFL(National Football League) concedido ao blind side do Baltimore Ravens, Michael Oher.

O título “The Blind Side” na linguagem futebolística se refere a posição tackle à esquerda, com o objetivo de proteger o lado onde o atacante, que está de costas não enxerga, o lado cego. Por aqui “Um Sonho Possível”(2009) supera qualquer preconceito seja com Sandra Bullock ou a temática do futebol americano, é um filme bem edificado, emocionante, correto e com toda a bagagem de otimismo e motivacional que histórias de sorte e superação podem nos proporcionar.

Tony Montana não é páreo para Um Profeta

18/03/2010

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Um drama prisional elaboradamente delineado numa França contemporânea onde novas leis do governo Sarkozy acerca da repatriação de prisioneiros tem impacto direto no rumo das personagens. O protagonista, Malik El Djebena, órfão francês de origem árabe condenado a seis anos de prisão, o motivo pelo qual entrou é irrelevante, “Un Prophète”(2009) irá revelar os fatores definitivos num processo de auto-descoberta e a jornada que lhe moldou uma (nova) identidade.

Malik, com de dezenove anos, é imediatamente acuado por uma dinâmica interna de subornos e tráfico da qual logo descobre que não há modo de sobreviver indiferente. Em troca de proteção, diga-se fugir da sentença de execução por parte da facção de prisioneiros oriundos de Córsega ( ilha do Mediterrâneo, dialeto italiano porém é administrada pela França), ele precisa executar outro preso do Bloco B, facção dos árabes. Numa cena incômodamente tensa ele treina como esconder uma gilete na lateral da boca. Reyeb posteriormente torna-se uma presença fantasma para seu jovemexecutor.

Sob um tom discreto anedótico, o protagonista é incorporado ao grupo dos corsos e assume tarefas cada vez mais importantes no (sub)mundo do crime, o ancião mafioso administra cada passo de Malik e agiliza seu direito de condicional, somente com a intenção de que ele lhe sirva também em trabalhos fora da cadeia, a esta altura, Malik deixou de ser semianalfabeto freqüentando aulas de francês e economia no presídio e dedicou-se a estudar por si só o italiano.

Outros personagens, um prisioneiro árabe com câncer terminal e um cigano traficante de haxixe, iram possibilitar a expansão da rede de contatos e contratos de Malik, que acaba num golpe magistral coloca inimigos frente a frente para acertarem suas contas enquanto arquiteta uma manobra para permanecer isolado (e ileso), me perdoem os aficionados por Scarface(1983) mas Tony Montana não é páreo para Malik.

As questões político-sociais e raciais são pilares que sustentam a trama, assim como uma análise acerca da (in)eficiência da instituição prisional não são a proposta final, mas fundamentam o desenrolar habilmente encorpado com toques modernistas em pontuados letreiros e um sofisticado surrealismo por parte de pequenas sequências oníricas acertadas pelo diretor parisiense Jacques Audiard [(De Tanto Bater Meu Coração Parou(2005)], que criou uma das fitas mais interessantes (e viciantes) do gênero. Grand Prix em Cannes, Bafta, 9 prêmios no Cèsar Awards, melhor filme e prêmio do Festival de Londres, indicações a Palma D’or, Globo de Ouro e Oscar, “Um Profeta” é um ícone do cinema contemporâneo.



La Teta Asustada

16/03/2010

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Paralisada pelo medo, Fausta tem inserida uma batata em suas partes íntimas para proteger-se do mesmo destino de sua mãe, ela é acometida por uma condição popularmente chamada “teta assustada” que acredita-se afligir filhas de mães que foram violentadas durante os anos de guerrilha no Peru.

Os elementos de “La Teta Asustada”(2009) são demasiado fortes e parecem absurdos num primeiro momento, porém o meticuloso olhar e estupendo mise-en-scène alinhado etnograficamente pela diretora e roteirista Claudia Llosa, que abre mão de qualquer pressão comercial, envolvem o contexto num fascinante realismo. As impecáveis composições de diversas cenas de casamento controem uma fidedigna, admirável e poética dissertação acerca da idiossincrasia folclórica, antropológica e sócio-cultural daquele microcosmo.

A mútua sensação de deleite e profundo incômodo são sentidas desde a abertura em que a mãe de Fausta entoa uma agradável melodia num antigo idioma dos Andes enquanto a legenda traduz o relato de horror atentado contra ela, um testemunho delineando o cinema como poderosa ferramenta numa impecável medida artístico-documental, que mereceu o prêmio máximo em Berlim 2009.

El Secreto de sus Ojos

15/03/2010

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Esposito (Ricardo Darin) é um investigador penal aposentado que decide escrever um livro baseado em um caso nunca resolvido na década de 70, quando uma mulher foi estuprada e espancada até a morte. Esposito se mantém particularmente movido pela devastação do marido da vítima. Ao reencontrar-se com Irene, sua supervisora na época das investigações, imediatamente percebemos uma faísca que denuncia antiga atração entre eles.

Sobre uma ponte temporal entre 1974 e o atual 1999, a adaptação do romance de Eduardo Sacheri, co-roterista com Juan José Campanella mantém o pulso literário focando nos diálogos e olhares ao invés das convenções de tensão de um thriller policial, uma posição ousada convertida em acerto por Campanella. O plano sequencia acima apresenta a maestria do diretor argentino que confere força ímpar ao longa.

Em “O Segredo dos Seus Olhos”(2009) a conhecida melancolia dos filmes argentinos está presente assim como a frustração tanto de Esposito quanto Irene acerca do passado, das escolhas e possibilidade de novas mudanças. Além do romance ainda não declarado dos protagonistas, as questões políticas que cercam o crime, na época da ditadura, permanecem na medida certa, sutis ainda que necessárias em uma fita centralizada na justiça, na memória e que nos conecta com sua reflexão acerca da energia que nos move, seja o amor ou a sede de justiça.

Whip it!

15/03/2010

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Em “Whip it!“(2009), Ellen Page mantém o arquétipo de Juno(2007), underground, decidida, espertona, rebelde.  Sua mãe (Marcia Gay Harden) a prepara para ganhar concursos de beleza pelo interior do Texas enquanto ela usa camiseta dos Misfits. Mães X Filhas.

Juno, quer dizer, Bliss estuda e trabalha como garçonete numa lanchonete com sua melhor amiga, uma noite vão escondidas a cidade vizinha assistir a uma exibição de Roller Derby(esporte de contato sobre patins) e daí você já imagina o resto do filme, e vocês estará certo, em todo e cada clichê que imaginar de “Garota Fantástica“(2009).

Bliss diz para a mãe que está num curso extracurricular enquanto treina no time perdedor com garotas tatuadas, de cabelos coloridos e atitude(!) entre elas a debutante na direção Drew Barrymore. Há espaço(demais) para um romance indie com o carinha da banda que a troca por uma groupie loira porém ‘Babe Ruthless” dá a volta por cima. Girl Power.

Jimmy Fallon é o árbitro e pretenso hilário comentarista das partidas, Andrew Wilson (Rushmore, Charlie’s Angels, Tenembaums) é o técnico que sempre fica em segundo lugar e Juliette Lewis é a líder do time adversário. Na trilha Little Joy, Kings of Leon, Radiohead, Mgmt e Raveonettes. Cultura Pop.

Uma cena das garota fazendo guerra de condimentos numa lanchonete. O dia do concurso de beleza que prometeu a sua mãe participar é no no mesmo dia da final do campeonato das Roller Derby Girls. Sessão da Tarde.

Entre Irmãos

14/03/2010

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O premiado dinamarquês  Brødre(2004) de Susanne Bier parecia improvável para Hollywood, contudo ganhou um (fraco) remake estrelado por Natalie Portman, Tobey Maguire e Jake Gyllenhaal pelas lentes do diretor irlandês Jim Sheridam.

Em “Brothers”(2009), a saída de Tommy da prisão é ofuscada pela partida iminente do irmão modelo para o serviço militar. Sam é o filho prodígio, que se casou cedo, tem filhos pequenos e uma carreira militar como o pai. No início do filme a tensão entre as escolhas dos irmãos é exposta num jantar familiar, essa é a parte drama.

Sam estava em um helicóptero abatido no Afeganistão e é dado como morto.  A notícia e os eventos que seguem o anúncio de seu presumido óbito são intercortados com cenas do recém prisioneiro dos talibãs sob torturas e coação. Esta é a parte guerra, que  intente explicitar os meios que levam a devastação psicológica de um soldado e prepara o espectador para as dificuldades emocionais de seu turbulento retorno.

Enquanto Sam é permanentemente traumatizado, o cunhado substitui a sombra do irmão assumindo um novo papel na família ganhando uma tenra confiança entre as crianças e, claro, a presumida viúva, esta é a parte romance, porém a soma das partes dissolvem a tentativa de um enredo firme e denso, o oposto, é entregue á superficialidade e mesmo com boas atuações as personagens são apenas nuances e idéias deles mesmos.

A Fita Branca

12/03/2010

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Palma D’or em 2009, “A Fita Branca” apresenta uma série de obscuros eventos que tomam lugar em uma vila rural, e majoritariamente protestante, alemã, às vésperas da primeira guerra mundial; e segundo uma narração inicial, estes acontecimentos podem esclarecer “algumas coisas que ocorreram neste país”.

Um fio de aço fora amarrado entre duas árvores  trespassando o caminho do médico que cavalgava em direção a sua residência, deixando-o gravemente ferido e seus filhos ficaram sob os cuidados da vizinha, com quem o viúvo nutre uma discreta porém sórdida relação. A perversidade cresce nos deliberados incidentes seguintes enquanto o narrador revela o intrincado cotidiano local, enraizado em repreensão sob forma de severas e indefectíveis formalidades, em grande parte, executadas metodicamente pelo pastor; a emblemática fita branca,  é uma das manobra de mortificação empregadas por ele para que seus filhos retomem a inocência, mais um símbolo de culpa e repressão que culmina numa espiral onde estas e outras criança são simultaneamente doestadores e vítimas.

O paralelo com “A Cidade dos Amaldiçoados” (1995) pode surgir a mente, mas diferente de John Carpenter, Michael Haneke segue apontando o mal para a condição humana, assim, dispõe imparcialmente os vestígios e revela gradualmente que o terror forasteiro(vindo de fora) é ilusório. The White Ribbon, A German Children’s Story(2009) está definitivamente mais próximo da máxima de Lars Von Trier na manutenção de uma estrutura comunitária, e na hipocrisia e crueldade de suas implicações, em “Dogville”(2003); Haneke  posiciona sua lente observando friamente o microcosmo desta aldeia com enviesamento amostral de uma Alemanha pré I Guerra.

De maneira crua, cerebral e monocromática, ressonante com a aspereza de seu roteiro, o diretor austríaco entrega a violência de forma ainda mais meditativa, quase filosófica, refletindo os brutais atentados como rebelião ao poder repressor. Quem serão esses filhos constantemente admoestados, abusados e silenciados em alguns anos? Esta é uma conexão para ilustrar um ambiente sufocadoramente reprimido em que os ideais nazistas posteriormente infiltraram-se.

Ilha do Medo

07/03/2010

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A adaptação homônima do livro “Shutter Island” de Dennis Lehane, que enreda misteriosos acontecimentos em um hospital psiquiátrico para criminosos condenados na década de 50, inicialmente seria dirigida por David Fincher [Seven (1995), Clube da Luta (1999), Benjamin Button (2008)] e protagonizado por seu muso Brad Pitt e Mark Wahlberg, ambos estavam em outros projetos e o roteiro foi enviado a Scorsese.

Di Caprio e Mark Ruffalo são apresentados como os agentes federais Teddy e Chuck investigando o desaparecimento de uma paciente com histórico de ter assassinado seus três filhos afogando-os, esta é uma das peças para o grande quebra-cabeças que entre flashbacks de sua experiência durante a II Guerra Mundial e visões de sua falecida esposa (Michelle Williams) passam a nublar a realidade com a crescente paranóia adquirida por Teddy, na medida que entramos neste limbo de possibilidades e conspiração que se mantém até uma surpreendente reviravolta.

Para os desavisados (e para evitar decepções) Ilha do Medo é um noir sobre paranóia, uma thriller psicológico com pano de fundo temporal no coração da Guerra Fria e rumores de questionáveis experiências científicas por parte dos nazistas, este cenário para inúmeras teorias da conspiração é tecido de forma meticulosa por Scorsese, costurado em alegorias como a água, a tempestade, a resistência dos diretores do hospital em colaborar com a investigação e o envolvimento pessoal de Teddy com o caso, por exemplo.

O mérito de Shutter Island(2010) foi ter caído nas mãos de Scorsese e sua equipe que fizeram uso exato da cinematografia, desde a própria arquitetura intimidadora de Ashecliffe, o figurino preciso, a densidade obscura de uma trilha cuidadosamente orquestrada abastecendo de forma eficiente o elemento (ilusório) do terror.

Crazy Heart

06/03/2010

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Coração Louco” é um longa que facilmente poderia ter ido direto para DVD se dependesse exclusivamente do enredo e direção do estreante Scott Cooper, que flerta com clichês do início ao fim, apresentando um filme convencional, previsível, com cara de anos 90 e resultou em três indicações ao Oscar. Culpem Jeff Bridges.

Bridges evoca seu Big Lebowski, principalmente na abertura do filme locada numa pista de boliche, porém Bad Blake não está lá por esporte, e sim para alguns trocados. O ator, ou, melhor ator, da alma ao cantor e compositor de música country Bad Blake. Aos 57 anos, completamente decadente, leva na bagagem um comportamento auto-destrutivo, casamentos falidos e um filho que não conhece. Sua rotina é passar dias na estrada, de motel em motel, apresentando-se em bares de cidades do interior, sempre entre uns tragos e vários goles de whisky.

É interessantíssima a personificação de Blake, sua postura é visceral e autêntica contracenando com seus coadjuvante. Maggie Gyllenhaal, mãe solteira que trabalha como jornalista para um jornal local de Santa Fé que se envolve romanticamente com Blake mas apesar dos esforços de ambos, ele parece já estar ‘quebrado’ pordemais. Colin Farrel é um pupilo de Bad Blake que alcançou a fama com as composições de Blake, que se vê obrigado a abrir seus mega estruturado shows. Robert Duvall, também produtor, tem um pequeno papel com dono de bar e amigo de Blake.

Um instinto de intimidade ressona numa modéstia positiva que deixa espaço soberbamente valorizado pelo elenco. Bridges no topo, concorrendo e certamente levando a estatueta de melhor Ator (aliado a exímia atuação e a falta de concorrência,  Jeff Bridges  já foi indicado outras quatro vezes e injustiçado em Big Lebowski), Maggie Gyllenhaal, com nomeação mas certamente não tem o impacto de Mo’nique (coadjuvante em Preciosa). Colin Farrell, cada vez mais versátil e pontuado, também foi um grande acerto em Crazy Heart(2009). O filme ainda concorre com  “The Weary Kind” a canção original.

UP do George Clooney

05/03/2010

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Em “Up in the Air”(2009), George Clooney é um executivo em uma consultora terceirizada que fornece seus serviços quando empresas enfrentam demissões em massa. Clooney é quem faz o tête-à-tête com os funcionários e lhes anuncia suas demissões sob a circunstância eufemista de “conselheiro” em um período de “transição de carreiras”. Passa 322 dias do ano l0nge de seu apartamento alugado e sucinto como tantos quartos de hotel em que passa. Família, ressentimentos e relacionamentos são alguns itens a serem despejados da mochila que carregamos diariamente, numa analogia que embasa suas palestras motivadoras; pouca bagagem é seu ideal.

Quantos filmes não vimos em que o charmoso e heremita protagonista em algum ponto é forçado a julgar que o sucesso, fama, dinheiro, ou no caso, milhões em milhas, não é nada se não temos com quem compartilhar ? Para cumprir essa premissa entram em sua vida Alex, sua versão feminina (“Pense em mim como a si mesmo com uma vagina”), com quem inicia o relacionamento perfeito de encontros casuais, e Natalie, jovem contratada da empresa acompanhando os métodos de trabalho do protagonista. Em atuações que não justificam as indicações que Vera Farmiga (de e O Menino do pijama Listrado(2009), Quid Pro Quo(2008) e Os Infiltrados(2006), apesar dos méritos na formação de uma sólida carreira) e a mediana atriz da franquia “Crepúsculo”( já diz tudo) Anna Kendrick receberam.

Amor Sem Escalas” é,de fato, um bom filme, ágil, cativante e com excelente cinematografia, vide belíssima composição visual nos créditos iniciais; há boa química entre os protagonistas numa sofisticada comédia romântica, ainda que não seja uma comédia romântica. O fator que integra a fita diz respeito a abordagem espirituosa (assim como fez em Juno(2007) e Thanks for Smoking (2005)) e reducionista de Jason Reitman tratando do tema das demissões em massa.

Alguns europeus, o francês Ressources Humaines(1999) por exemplo, já haviam trazido esse amargo resultado do corporativismo capitalista em tempos de recessão, mas Jason roterizou o romance homônimo de Walter Kirn em um blockbuster americano. O ponto alto no enredo da crise econômica  está na sempre magnética presença de JK Simmons (Burn After Reading (2008) e Juno) está entre os demitidos, que inclusive figuram um epílogo relatando algumas otimistas experiências que podem ser extraidas em uma “transição de carreira”: seis indicações ao maior prêmio do cinema americano: condescendência.

Precious

01/03/2010
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Ramona Lofton nasceu em 1950 no interior da Califórnia, filha de militares que estavam sempre viajando, até que seu pai decidiu se fixar em Los Angeles e a família se desfez com o abandono por parte de sua mãe sucedido pelo alcolismo; largou o colégio, mudou-se para São Francisco onde também abandonou os estudos numa faculdade comunitária e começou a participar de movimentos de contracultura, Black Power, passou a usar drogas e escrever poesia onde assinava Sapphire.

Aos 27 anos mudou-se para Nova York com a intenção de ser escritora, prostituiu-se e entrou para comunidade lésbica “uma saída para a vida que meus pais tiveram”. Aos 33 formou-se em dança na faculdade pública do Brooklyn e aceitou emprego como assistente social e posteriormente como professora de alfabetização em áreas pobres como Bronx e Harlem, onde morava. Em 86 sua mãe faleceu e seu irmão assassinado, seguido de anos escuros que mudaram sua escrita e trouxeram a superfície lembranças dos abusos sexuais cometidos pelo pai em sua infância.

Escreveu poemas usando a perspectiva de um dos agressores, onde tentou mostrar como a ignorância e a falta de esperança pode facilmente evoluir para a violência gratuita, e durante seu mestrado na mesma faculdade do Brooklyn publicou uma coletânea e posteriormente recebeu uma enorme quantia para publicação de dois livros. “Push” foi publicado em 96 e tem por toda parte a vivência de “Safira” em mais de um personagem: na protagonista, no incesto, na escola de alfabetização, na homossexualidade de sua professora, na assistente social.

Precious é pobre, negra, obesa, analfabeta, abusada sexualmente pelo pai, com quem teve uma filha a quem chama de Mongo “de mongolóide”, ela relata para a assistente social, a criança criada pela avó tem síndrome de down, Precious está grávida novamente. A adaptação para o cinema por Lee Daniels, assim como em Shadowboxer (2005) é cru e imediato, fugindo de qualquer indulgência.

A beleza extraída de um roteiro tão trágico quanto polêmico se deve as incríveis atuações da Gabourey Sidibe e Mo’Nique (incrível ), ambas com indicações ao Oscar, Mariah Carey, como assistente social, Lenny Kravitz, enfermeiro no segundo parto de Precious. Precious: Based on the Novel Push by Sapphire(2009) ainda concorre a melhor filme, edição, direção e roteiro adaptado.

Em Shadowboxer, a personagem de Mo’Nique se chamava Precious.

Rain na chuva

01/03/2010

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Raizo, interpretado pelo coreano Rain (Speed Racer 2008), foi um órfão criado por um clã secreto que desenvolve exímios assassinos sob intensa e dolorosa rotina de filosofia e treinamento ninja. Quando outra aluna com quem nutria afeição mútua é executada depois de tentar fugir, Raizo se volta contra seu mestre e assim declara guerra contra seus ‘colegas de escola’ com clã. Sob este contexto e a premissa de que esses mestres marciais existem e são pagos 100 libras em ouro por governos do mundo todo para assassinar, “Ninja Assassino” entrega o que vende, muita cena de ação, alguns dedos e membros inteiros pelo chão decepados impiedosamente pelas poderosas lâminas samurais.

O desproporcional burburinho se deve a produção dos irmãos Wachowski, criadores da trilogia Matrix (1999-2003) e a direção de James McTeigue (“V de Vendetta”2005) abusando de recursos computadorizados para captar os vôos alçados por membros fatiados, jatos de litros e mais litros de sangue espirrados artisticamente pelas paredes de forma surpreendentemente  convincente.

Sequências dos confrontos e carnificina resultante de difícil coreografia são muito bem orquestradas, inclusive uma que remonta timidamente e evoca o know-how da cena da via expressa em Matrix Reloaded(2003), o que corresponderia a elevar o status do longa no gênero não fosse, apesar de se assemelhar a uma versão oriental do Keanu Reeves, Rain não possui o magnetismo suficiente esperado para o protagonista, tampouco a agente Mika (familiar rosto coadjuvante Naomie Harris) com quem Raizo formará uma dupla dinâmica com posterior conotação romântica.

Epopéia holística de 300 milhões de dólares

28/02/2010

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A primeira vez que vi a imagem de um Na’vi, não tive a menor vontade de passar 3 horas assistindo aqueles thundercats azuis, me pareceu um filme estritamente adolescente. Depois veio o marketing massivo sobre a revolução tecnológica e as marcas que o filme atingia e muitas críticas o elevando a parâmetros que me deixaram no mínimo curiosa.

Na estória, missão das forças armadas são enviadas á um satélite com características inacreditavel e improvavelmente bastante similares com as da Terra, e a personagem de Sigourney Weaver lidera o grupo de cientistas que pretende estudar as peculiaridades da fauna e flora de Pandora; tamanho é seu fascínio com harmonia da natureza e seu discurso ecologicamente correto sempre entre um cigarro e outro. Enquanto isso não é discreto o objetivo real do chefe corporativo, o erroneamente escalado Giovanni Ribisi: extrair um mineral valioso. Sim, a sustentabilidade versus lucro, Avatar(2009) é uma grande alegoria a política atual.

A revolução 3D não se resume a monstros pulando da tela, a proposta é imergir o telespectador na natureza fluorescente de Pandora, um grande CGI, é bem bonito, pouco realista, mas exótico e bonito. Os movimentos dos nativos de Pandora são, de fato, bem convincentes, diferente das raízes capilares que os conectam com outros seres, árvores neon que ecoam vozes inteligíveis dos ancestrais Na’vi e outras manobras holísticas. O fato de alguns nativos terem frequentado uma escola dos cientistas e terem voluntariamente aprendido inglês foi o fim da picada.

O militar paraplégico Jake Sully (Sam Worthington) é capaz de correr pelas florestas luminosas através de sua carcaça Na’vi, infiltra-se na comunidade local sob os ensinamentos de uma thundercat smurf e esse relacionamento culmina num romance inter espécimes numa cena constrangedora (esses bichos azuis não me apetecem). O militar-mor e sua sede de guerra foi um acerto em meio a epopéia zen e o cruel atentado motivado pela ambição comove, em contrapartida a manobra disneylandica de Sully para provar sua fidelidade a bandeira Na’vi é um dos elementos que remete Avatar a um filme adolescente.

The (not so) Lovely Bones

25/02/2010

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The Lovely Bones“, de Alice Sebold, é um aclamado romance centrado no assassinato de uma jovem de 14 anos que acompanha as conseqüências de sua morte através do limbo no qual se encontra, acompanha o isolamento de seu pai, sua mãe abandonando a família e a investigação do crime sendo encerrada sem sucesso.

A jovem Susie também assiste a outros assassinatos de seu executor impune assim como a infância traumática que teve e chega mesmo relutante a ter pena dele; mas isso não é mostrado na adaptação de Peter Jackson para os cinemas, da mesma forma que não há menção ao estupro, ao adultério de sua mãe com o investigador ou o cotovelo de Susie encontrado no milharal onde foi esquartejada.

Na versão light de Peter Jackson predomina sua obsessão com efeitos especiais e sua interfaces computadorizadas nas ricas paisagens do limbo pós-morte, algumas realmente belas, como a transposição do momento em que seu pai quebra garrafas com navios dentro, elas aparecem em tamanho real atracando na praia do limbo. Outras cenas em que Susie e sua nova companhia, Holly, outra vítima de Harvey, brincam pelos diversos oníricos cenários e sobem morros verdejantes parece mais uma versão adolescente de teletubbies, não cativam.

Com exceção de “Almas Gêmeas”(1994), não tenho nenhuma empatia pelos filmes de Jackson, mas o trailer de The Lovely Bones era promissor, todavia uma trama em que Susie se corresponde com seus familiares e os conduz a seu assassino não procede, sua (falta de)comunicação é apenas sentida como uma presença, e o único momento em que ‘se materializa’ é para ter o primeiro beijo que nunca teve (em vida). Oh.

Mesmo sem dicas do além, o solitário e esquisito vizinho atrai suspeitas do pai e da irmã mais nova, mas não concretizam na prisão do mesmo, que é mostrado no final caindo de um penhasco num acidente. Stanley Tucci no papel do assassino concorre a melhor coadjuvante no Oscar, mas Harvey beira o clichê. O resto do elenco é desperdiçado Rachel Weisz, Mark Wahlberg, só há algum espaço para Susan Sarandon, entre um trago e um gole, cuidar dos netos na ausência da mãe.

Um olhar do Paraíso” é na verdade apenas “O olhar do paraíso”, nada mais. Ao suavizar por completo as menções e detalhes mais obscuros da estória, Peter Jackson não apenas abaixou a classificação indicativa como o configurou como um excelente filme para crianças, tratando de forma zen o tema da morte, configurando um paraíso como um bolo confeitado e alerta aos perigos em aceitar convite de estranhos para visitar instalações subterrâneas.

“An Education”

19/02/2010

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An Education”(2009) é um filme difícil de se comprar. Ao contrário do que tenta vender, um romance de uma jovem ingênua seduzida por “um grande Gatsby”, o ensaio autobiográfico é sinônimo de auto-engrandecimento de sua autora, Lynn Barber.

Assim como no romance de Fitzgerald o pós-guerra pontua a Londres suburbana da década de 60, onde Alfred Molina é mostrado inicialmente como pai disciplinador e implacável quanto ao objetivo que sua filha consiga uma vaga em Oxford. Jenny está empenhada e parece corresponder as expectativas do pai enquanto no tempo livre sonha em viajar para a Paris.

“Serei francesa e vestirei preto” num momento Acossado(1960) de Godard, Jenny adora lançar sentenças no idioma francês, escutar Juliette Greco e discutir existencialismo com suas amigas de colégio(ok.). Durante uma tempestade, a adolescente prodígio é abordada um judeu balzaquiano num Bristol vermelho que oferece para proteger seu violoncelo da chuva e Jenny aceita a carona.

Ele convida a estudante para um concerto de verdade e logo depois Jenny já está fugindo do colégio para participar de leilões de obras de arte, das quais se mostra vívida amante e conhecedora e igualmente desenvolta na companhia de David e seu sócio em jantares regados a champagne. Em poucas semanas Jenny já é uma mulher e cúmplice da lábia de David que seduz seus pais a deixá-la viajar num fim de semana e posteriormente para Paris. Claro que há algo de oculto em David e a previsão de um desfecho infeliz é iminente.

O roteiro de Barber e Nick Hornby (“Um Grande Garoto” e “High Fidelity”) segue glorificando a arrogância da jovem que faz questão de relatar seus mimos para todo colégio e desacata suas professoras dizendo como são graduadas porém ‘mortas’ enquanto ela ouve música boa em lugares fascinantes. Essa exaltação e manipulação para essa espécie distorcida de heroísmo na personagem de Carey Mulligan é irritante, ela sequer está apaixonada pelo excelente e preciso Peter Sarsgaard, que parece ele estar apaixonado e tem ciúmes e não um predador.

Quando ela descobre seus negócios ilícitos de David não se abala pois eles que financiam seu novo mundo cheio de sofisticação, viagens e festas no jockey. O anticlímax é a primeira noite de amor, crua, quando Jenny conclui “Toda aquela poesia e todas aquelas canções sobre algo que não dura nada”.

Jenny não foi cegamente seduzida, assistia David mentir para seus pais e roubar obras de arte e ainda assim abandona o colégio para casar-se com ele, para manter os mimos que desejava e sua prepotência é capaz de culpar os pais pela imprudência de deixá-la sair com um rapaz mais velho caso as coisas não dêem certo. É irritante vê-la associada a alguma espécie de vanguarda ou feminismo quando Jenny é mimada, interesseira e arrogante.

As lentes da dinamarquesa Lone Scherfig abusam do seguro e deixa o filme redondo. A bonequinha de luxo teen acaba de render o BAFTA de melhor atriz para Carey Mulligan, mas o melhor filme britânico, ainda que o desfecho seja o mesmo que em “An Education” foi para o crível e sensível “Fish Tank”( http://wp.me/pCZrc-2o) .

The Hurt Locker

18/02/2010

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O termo Hurt Locker é uma gíria usada para um soldado num lugar extremamente inóspito cujo risco de vida é muito grande e imprevisível. The Hurt Locker, a história, foi escrita por um freelancer que acompanhou um esquadrão antibombas. The Hurt Locker, o filme, dirigido por Katherine Bigelow, acompanha a rotina do sargento William James, líder substituto de uma equipe de desarmamento explosivo em Bagdá.

Entre desativar uma bomba no prédio da ONU, envolver-se com um grupo britânico militar privado num tiroteio contra rebeldes e recuperar dispositivos num armazém, a tensão na equipe Bravo aumenta com a imprudência de James, que coloca mais do que a si próprio em risco em troca da adrenalina.

Sem glorificar ou justificar a violência, Guerra ao Terror(2008) não é um filme de viés político. É um drama/ação centrado numa guerra atual, o que coloca o entretenimento em conflito, pois a maioria dos espectadores não aspira num filme de ação deparar-se com a realidade de forma tão crua e imediata, e a execução  muscular das câmeras de Bigelow consegue sustentar o longa sobre esta premissa.

Ralph Fiennes, Guy Pearce, e Evangeline Lilly nos remete para a ficção, mas o fato de serem deixados para personagens periféricos ajuda a construir a credibilidade do vigor realista do protagonista Jeremy Renner, ou seja, os êxitos apontam, de fato, para a ousadia da diretora, que transformou um filme independente num nomeado a 8 categorias no Oscar deste ano, onde o mais merecido é o dela.

A Serious Man

16/02/2010

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A Serious Man (2009) é um filme fascinante, o melhor entre os indicados ao Oscar, o que o torna infelizmente por demais subestimado enquanto seus ordinários e previsíveis concorrentes são exaltados. Não é um longa apelativo, nem de identificação imediata com o protagonista Larry Gopnik, um professor de física judeu, nem por isso menos, ou melhor, exatamente por isso é soberbo.

O breve entusiasmo de Larry acontece quando ensina o paradoxo de Schrodinger para uma platéia nada recíproca, e essa falta de conexão parece invadir sua vida. Sua mulher o aborda numa inesperada conversa onde num único parágrafo é capaz de pedir o divórcio, exigir uma cerimônia religiosa para tal, nomear seu atual amante e o expulsar para um quarto de motel. Seus filhos também tem vida própria ainda que não respeitem, ou comovam-se, em nenhum momento com a dele.

A “perspectiva” é evocada não só quanto ao fato do gato de Schrodinger estar vivo ou morto, mas igualmente no folclore iídiche apresentado na forma de prólogo, um homem auto-proclamado racional recebe outro para jantar enquanto sua mulher acusa o convidado de dybbuk, um morto-vivo. Assim como das fábulas bíblicas, Larry quer extrair um significado das coisas que acontecem, das decisões que parecem estar sendo tomadas por terceiros, seja na sua profissão ou família, e procura sua resposta na sabedoria de três rabinos, enquanto tenta se manter correto: um homem sério.

A narrativa é precisa e ainda assim, como o protagonista, não temos idéia alguma do que está por vir, acompanhamos o desenrolar da mesma forma que Larry, tentando compreender uma razão maior, duvidosos do acaso ou completa falta de sorte. Essa soberba sincronia, numa exímia edição, executadas pelos próprios irmãos Cohen sob o pseudônimo de Roderick Jaynes, transbordam a genialidade na forma mais autoral e madura dos cineastas.

Zombieland

15/02/2010

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A abertura de Zumbilândia é bem dinâmica e ousada, apresentando o enredo delineado pelas regras de sobrevivência de um adolescente num mundo dominado por zumbis, as regras são dispostas na tela e retomadas ao longo do filme, um recurso que cativa bastante.

Jesse Eisenberg (“A Lula e a Baleia”(2005)) é um jovem solitário e em sua primeira aproximação com uma garota acaba sendo atacado quando ela transforma-se em zumbi. Posteriormente, num cenário onde os humanos são raros, Jesse ganha um parceiro completamente descuidado e impulsivo, o oposto do nerd franzino, Woody Harrelson não mede cautela em busca de seus doces twinkies, o que é bem idiota, mas estamos em uma comédia de zumbis, é divertido; enquanto o personagem de Jesse foge dos zumbis, Harrelson parece se divertir os atacando de diferentes formas. Já as irmãs Emma Stone (“Minhas Adoráveis Ex-Namoradas”(2009)) e Abigail Breslin( a pequena miss sunshine) tem suas próprias regras de sobrevivência a despeito de alguma simpatia de Emma por Jesse.

Eles se chamam por pseudônimos como Columbus, Witchita, Little Rock, segundo Tallahassee(Woody) a manobra evita que se crie intimidade, é fofo. E o filme surpreende com a participação hilária de Bill Murray, interpretando ele mesmo.

O diretor estreante em longas Rubem Fisher acerta em fazer um filme curto e ágil. Apesar de um ótimo entretenimento esperamos que a sequência, Zombieland 2, anunciada para 2011 tenha o mesmo fôlego e dinâmica; o contexto deve envolver um romance para Woody e a crise da adolescência de Abigail num mundo devastado por mortos-vivos.

Baumbach em Berlim

15/02/2010

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Noah Baumbach inicialmente apresenta Florença(Greta Gerwig, conhecida de mumblecores), assistente pessoal de uma rica família de Los Angeles, que aos 25 anos se divide entre as funções de governanta, babá, secretária e, com a família tirando férias prolongadas, além do cachorro é encarregada de ficar de olho no recém-chegado irmão do patrão. De Nova York recém-saído de uma clínica após uma crise, Roger Greenberg decide “fazer nada da vida” por um tempo enquanto redigi cartas de reclamação para empresas e tenta se reconectar com antigos amigos e se redescobrir a cidade natal.

São Greta Gerwig(atriz de mumblecores) e Ben Stiller os protagonistas de “Greenberg”(2010), quinto filme do roteirista de The Life Aquatic with Steve Zissou (2004) e Fantastic Mr.Fox(2009) de Wes Anderson, com quem divide a temática da tentativa de explorar o ethos contemporâneo, consegue sua assinatura num tratamento mais cru e ácido dessa ingrata busca de uma realização pessoal numa geração que não encontra mais satisfação/motivação na construção de uma família ou de um império.

O roteiro foi escrito em parceria com sua mulher  Jennifer Jason Leigh, que também atua sob a direção do marido(assim como em Margot at the Wedding(2007)). O casal, que trocou Nova York por Los Angeles, aborda a idissincrasia das cidades que são coadjuvantes em Greenberg, que teve premiere em Berlim esta semana.

A música “New York, I Love You But You’re Bringing Me Down” do LCD Soundsystem  inspirou o longa segundo Baumbach durante a coletiva no Festival: “uma canção sobre o envelhecimento, sobre a sensação de que você está perdendo o auge”.

The Imaginarium of Doctor Parnassus

14/02/2010

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Dr. Parnassus (Christopher Plummer) é um contador de histórias que viaja na companhia de seu fiel escudeiro anão, sua filha e um ajudante apaixonado por ela. A trupe itinerante estaciona a precária moradia sobre rodas e a desdobram num palco de circo tentando angariar espectadores dispostos participar da apresentação e passar através de um espelho capaz de abrir as portas de um mundo que permite explorar os mais sombrios reinos da imaginação.

Heath Ledger, interpretava um trambiqueiro que ajuda Parnassus a tentar ganhar uma aposta com o diabo (interpretado pelo compositor Tom Waits) para libertar sua filha. Para completar o longa, Terry Gilliam convocou Johnny Depp, Jude Law e Colin Farrell para interpretar o mesmo papel.

O estratagema funciona perfeitamente já que Ledger concluiu as cenas ‘fora do espelho’ do início ao fim da estória, então Depp, Law, Farrell tomam seu lugar apenas durante cada incursão no mundo da fantasia, e o fazem de forma excelente incorporando os trejeitos evocados na atuação de Ledger, principalmente Colin Farrell, que me surpreendeu.

Infelizmente as excelentes atuações e direção de arte não foram capaz de transformar  “O imaginário do doutor Parnassus“ num grande filme. Frustrante já durante o filme perceber o diretor de um dos meus filmes preferidos, “Os 12 Macacos”(1995) errando a mão. Contudo, Parnassus(2009) concorreu nas categorias Melhor Figurino e Direção de Arte no Oscar.



Howl

12/02/2010

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Os cineastas Rob Epstein e Jeffrey Friedman, dos premiados Common Threads: Stories from the Quilt (1989) e The Times of Harvey Milk(1984), documentário que inspirou “Milk” de Gus Van Sant, parecem ter eles próprios se inspirado na atuação de James Franco como parceiro de Harvey Milk, interpretado por Sean Pean em 2008, e o convocaram para protagonizar outro vanguardista homossexual, o poeta Allen Ginsberg.

É a performance de James Franco o foco dos elogios enquanto o conjunto da obra narrativa centrada no poema de Ginsberg, que dá nome ao longa, perpetuou o estigma que ronda os filmes de abertura de Sundace, como, um tanto quanto, decepcionantes.

Howl (2010) se desdobra em três partes: a fotografia preto e branco de uma platéia de jovens hedonistas deliciados com as locuções bravatadas do poeta igualmente entusiasta de literatura, sexo e drogas. Tempo depois, como artista já estabelecido, e em cores, Ginsberg discorre sobre seus métodos numa postura plenamente esclarecida na condição de entrevistado. A terceira parte é o dessaboroso julgamento da editora Lawrence Ferlinghetti, acusada de obscenidade pela publicação do poema de Ginsberg.

A narrativa é o recusro que revela, por exemplo,  sua obsessão com outros personagens da geração beatnik ao invés desses fatos serem encenados; e o elemento da experimentação segue em sequências de animação que transcrevem por demais literal, suas palavras. Esse híbrido cinematográfico que, brilhantemente ou não, intente o nascimento de uma contracultura concorre ao Grande Prêmio do Júri em Sundance e repete a indicação na competição do Festival de Berlim.

Tuan Yuan, a culinária e o júri.

11/02/2010

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Yu Nan compõe juntamente com a diretora italiana Francesca Comencini, o escritor somaliano Nuruddin Farah, o produtor espanhol José Maria Morales e as também atrizes Renée Zellweger e a alemã Cornelia Froboess, o júri do 60 ° Festival de Berlim presidido pelo cineasta Werner Herzog.

A chinesa ganhou prêmio de melhor atriz no Festival Int. de Chicago por seu papel em  “Tuya’s Marriage/ Tuya de Hun Shi” (2006): que rendeu ao diretor Quanan Wang o Urso de Ouro e prêmio Ecumênico do Júri em 2007. E é seu novo filme o escolhido para a cerimônia de abertura deste ano.

Apart Together/ Tuan Yuan” (2010), que conta a história de amor de um soldado que deixa uma China dividida em tempos de tragédia e foge para Taiwan em 1949 e em seu retorno encontra seu amor perdido muitos anos após as tropas de Mao Tse Tung terem partido.

Mesmo separados por décadas e ela com marido e filhos, eles ainda estão apaixonados e a tensão cresce durante extravagantes refeições, inserindo o épico chinês dentre os onze escolhidos para a 4ª Culinary Cinema do Berlinale, evento paralelo que apresenta filmes que relacionam comida com amor, natureza ou meio ambiente, onde algumas sessões são seguidas de jantares inspirados nos filmes.

The Killer Inside Me

10/02/2010

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O novo longa do inglês Michael Winterbottom está na programação do 60 Berlinale depois de ser apresentado em meio a polêmica em Sundance onde  algumas pessoas deixaram a sessão indignadas durante a exibição do filme. The Killer Inside Me (2010) é um remake baseado no conto homônimo de Jim Thompson lançado em 1952 que foi descrito por Stanley Kubric, que trabalhou com Thompson em The Killing(1956), como “provavelmente a mais fria e crível história em primeira pessoa de uma mente criminalmente distorcida que eu já encontrei” e introduzido como “um dos mais intransigentes romances policiais já escritos” numa antologia de contos policiais noir da década de 50.

Para os que ficaram na sala foi elogiada a ferocidade da performance de Casey Affleck interpretando um sociopata oculto por seu ordinário comportamento como o jovem xerife Lou, que dá espaço a sua verdadeira faceta sádica quando inicia um relacionamento com a prostituta Joyce Lakeland, papel de Jessica Alba. A princípio a violência é consensual mas culmina com Lou a espancando até que apareçam os ossos da sua face, num resultado descrito como “carne de hambúrguer” por outro personagem. Com Joyce em coma o xerife inicia uma série de assassinatos na tentativa de mascarar a verdadeira identidade do agressor até que começa a dar sinais de sua insanidade e torna-se suspeito. E  Winterbottom mergulha com fidelidade na perversidade explorando o noir em sua forma mais obscura.

A polêmica tem seguido não apenas pela gratuidade da violência mas pela misoginia do protagonista quanto as cenas que enfatizam a tortura com que as vítimas mulheres são brutalizadas, como a personagem de Kate Hudson. Ainda estão no elenco Bill Pullman e Simon Barker.

O diretor, que costuma alternar entre temas político-sociais como A Doutrina de Choque(2009), O Preço da Coragem(2007),The Road to Guantanamo(2006), In this World (2002), Welcome to Sarajevo (1997) ou relacionamentos em família e amorosos, Genova(2008),White or Without you (1999), I Want You (1998), Butterfly Kiss (1995), nunca deixando de lado a sexualidade, exaltado o sexo no explícito 9 Canções (2004), onde confessou ir ‘em oposto extremo ao puritanismo e recalque da indústria cinematográfica’, parece ter agora atingido novos extremos.  Quando perguntado após a sessão de The Killer Inside Me sobre a reação de uma espectadora que saiu gritando “Nojento!”, Winterbottom após segundos de silêncio disse: “Próxima pergunta?”

E para 2011 deve reunir todas suas predileções em “The Promised Land”, thriller de crimes políticos centrado na Palestina durante o fim da Segunda Guerra. Colin Firth está confirmado na composição do elenco.

The Invention of Lying

09/02/2010

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Ricky Gervais, ganhou fama com a elogiada série The Office,  o que poderia (e)levar expectativa sobre a comédia escrita, dirigida e protagonizada por ele; porém em The Invention of Lying (2009) o humor de alto conceito deixou lugar para a mediocridade e que no fim das contas se encerra uma comédia romântica muito fraquinha sobre uma mocinha, Jennifer Garner, dividida entre um gordinho simpático que a ama e um cara bonito(?) mas completamente arrogante.

O filme, como apresentado no trailer até promissor, tem a intençao de relatar um mundo onde as pessoas nunca mentem e tiradas como “seu bebê é muito feio” não violam nenhuma etiqueta social, o que funciona para um skit de programa de humor por exemplo, mas, essa tentativa de explicitar a incapacidade de não mentir em  exclamações aleatórias  não sustentam a proposta e surgerem inúmeros buracos no roteiro, falhas que inexistem em outras comédias parecidas como Todo Poderoso(2003) ou Click(2006) onde o espectador compra a idéia, e  “The Invention...” é preenchido por situações soltas para tentarser acreditável até que desvia de vez para se resumir na busca de alguma simpatia para que Ricky Gervais fique com a mocinha no final. Assistindo ao longa não alternei expressão que fosse muito diferente da dos protagonistas nesta cena acima.

Delicious em Sundance

03/02/2010

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Sympathy for Delicious(2010) conta a estória de Delicious Dean, um dj que recentemente sofreu um acidente e está condenado à cadeira de rodas. Morando em seu carro, Dean  faz suas refeições com moradores de ruas que recebem este auxílio de um jovem padre, papel assumido pelo próprio Mark Ruffalo em seu début como diretor.

O protagonista em sua busca pela cura através da fé descobre-se capaz de curar outras pessoas com suas mãos, e acaba usando seu dom promovendo uma banda de punk-rock que o agrega pela publicidade. Orlando Bloom (ao que parece com uma atuação emblemática) e Juliette Lewis são membros da banda, e o filme ainda conta com Laura Linney.

O roteirista Christopher Thornton, que interpreta Delicious Dean, sofreu um acidente e ficou paralisado da cintura para baixo aos 25 anos, condição que não privou de atuar, principalmente no teatro. Apesar das críticas quanto ao domínio de Mark Ruffalo por trás da câmera, a ousadia do drama independente que mescla com humor negro as questões da fé e os excessos do mundo do rock valeu prêmio Especial do Júri de Sundance.

Obselidia

02/02/2010

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Um solitário vendedor de enciclopédias decide documentar em VHS um catálogo de coisas obsoletas. Em sua jornada conhece uma jovem projetista de cinema mudo e juntos seguem para o Vale da Morte entrevistar um cientista recluso que prevê a quase extinção da população por mudanças climáticas iminetes e irreversíveis. Conduzidos de forma mansa e encantadora por Diane Bell, os protagonistas enfrentam o fatídico de nosso tempo, a questão, se o mundo acabar amanhã, o que fazer hoje ?

A roteirista e diretora orquestra uma carismática produção recheada de idiossincrasias e diálogos cativantes. Conectando a obsolescência e a durabilidade das coisas com a real ameaça do aquecimento global, que Bell pessoalmente credita à insaciabilidade consumista e, evocou referências que recontam a história do cinema de Wim Wenders em “Paris Texas”(1984) e Truffaut em “Jules et Jim”(1962) e “L’homme qui aimait les femmes”(1977), ao romance de Woody Allen em “Annie Hall”(1977) e de Richard Linklater em “Before Sunrise”(2004) assim como Luc Moullet em “Brigitte et Brigitte”(1966) e John Carney “Once”(2006) para a realização de Obselidia(2010).

Além do prêmio de ‘Excelência em Cinematografia’ na categoria Drama, para Zak Mulligan, o longa levou $20.000,00 da Fundação Alfred P. Sloan, prêmio concedido a filmes que enfocam a ciência ou a tecnologia como tema, ou descrevem um cientista, engenheiro ou matemático. Andrucha Waddington por “A Casa de Areia” e Werner Herzog por “Grizzly Man”(2005) também conquistaram esse prêmio em anos anteriores do Festival de Sundance.

Blue Valentine

31/01/2010

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Ryan Gosling é um jovem trabalhor sem muita ambição apaixonado por sua família; a química do ator com Faith Wladyka, que interpreta sua filha Frankie, reflete a cumplicidade e o quão adorável é o relacionamento dos dois: quando a cadela da família some e Dean percebe que não vai voltar ele diz para a filha: “Acho que ela se mudou para Hollywood para ser um cachorro de filme”. Em contra partida sua relação com a esposa Cindy (Michelle Williams) parece ter sofrido o desgaste natural e sórdido de muitos casamentos.

Em Blue Valentine (2010), título inspirado na canção homônima de Tom Waits, Dean tem a bem intencionada idéia de levar Cindy para um motel temático na tentativa de aproximar o casal. Nesse momento o diretor Derek Cianfrance nos transporta ao passado onde o jovem casal se conheceu junto com o encantamento extasiado do início de um relacionamento amoroso. Nessa elipse, Cianfrance discorre sobre da degradação do amor, assim como diz não esperar simpatia ou o oposto acerca de suas personagens, pois “as levezas e as trevas” fazem parte da condição humana e acabamos por dividir os dois lados num relacionamento com outra pessoa.

Essa justaposição do diretor não foi tão exaltada pela crítica quanto a expressividade na trilha indie de Grizzly Bear e a performance do casal, que fez com a Weinstein co., empresa dos irmãos Weinstein, fundadores da recém-extinta Miramax, acreditar inclusive que este papel pode render a Michelle Williams uma indicação ao Oscar e vai distribuir o longa, aposta que pretende cobrir os prejuízos pela decepcionante bilheteria do musical Nine (2009) e em meio a essa transação em Sundance ainda há rumores de demissões na companhia.

Tucker & Dale Vs Evil

28/01/2010

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Dois caipiras pretendem passar uns dias tranquilos em sua cabana quando cruzam com um grupo de universitários que vão acampar na região, nesse primeiro momento os preconceitos cotra os ingênuos Tucker e Dale já aparecem. Sequencia peitos, drogas e estórias de terror na floresta. Uma das jovens é salva por um dos caipiras quando se acidenta no rio mas acabam acusados de sequestro despertando nos turistas sede de vingança. Os mal-entendidos se embaralham conforme a pilha de corpos aumenta. E esse tem sido um dos filmes com maior aprovação em Sundance 2010.

A comédia-horror, primeiro longa do ator Eli Craig, tem recebidos inúmeras críticas positivas, desde as hilárias atuações dos ‘caipiras’ Alan Tudyk e Tyler Labine para a sagaz execução com que Craig divide o humor e o terror entre usuais clichês e diálogos ágeis conferindo um status de “cult” do gênero. Com essa entusiasmada recepção espera-se que algum grande nome da indústria distribua Tucker & Dale Vs Evil(2009), quem sabe também por aqui.

J.D. Salinger por J.P.Schaefer

27/01/2010

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Um tanto quanto subestimado, o trabalho do roteirista e diretor J.P. Schaefer, Chapter 27, lançado em Sundance 2007, evoca a conhecida obsessão do assassino de John Lennon pelo personagem principal da obra “The Catcher in the Rye” de J.D. Salinger, que possui 26 capítulos.

Schaefer mergulha na obscura peregrinação de Mark David Chapman nos dias que antecedem seu crime infame. Sua exímia interpretação sugere uma introspecção acerca  de sua obsessão por John Lennon mais do que uma tentativa de explicar seus motivos. Nos poucos momentos que não envolvem os solilóquios de Chapman, surge a personagem de Lindsay Lohan, que engata um despretensioso diálogo entre fãs mas não demora a perceber algo errado no comportamento de Letto, que engordou mais de 20 quilos para dar veracidade necessária nesta fita minimalista e inteligente ao desconfigurar os atributos sobre e sub-humanos entre o psicopata e o ídolo.

Coincidências (aleatórias ou não) Mark Lindsay Chapman é o nome do ator que interpreta John Lennon. No mais, talvez esta não seja uma influência de que Salinger se orgulhasse mas demonstra o arrebatamento lírico de sua atemporal e mais cultuada obra.

The (not so) Great Buck Howard

26/01/2010

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Os primeiros minutos de A Mente que Mente(2008) contam de forma dinâmica, ágil e criativa as opções de Troy quanto a escolha de sua futura profissão, desde o clássico “quero ser astronauta”, passando por cortador de grama e tendo toda e cada opção vetada pelo pai, que só aceita que Troy se torne um advogado, e lá está ele cursando a faculdade de Direito quando o diretor e roteirista Sean McGinly abandona por completo o encantador dinamismo do início e embarca no que mais se parece com um teste de paciência cansando o espectador até o último minuto.

Troy, interpretado por Colin Hanks, filho de Tom Hanks, decide largar a faculdade e até descobrir sua verdadeira vocação se vê empregado como assistente de um minguante mágico/mentalista, Buck Howard, que lhe promete o que nenhuma faculdade poderia oferecer: experiênica de vida(!). Desocupado e precisando do dinheiro Troy viaja com Buck que apresenta seu show para pequenos públicos em pequenas cidades do interior dos Estados Unidos e das escolhas pessoais de Troy, o filme passa a enredar a rotina de subcelebridades e explora de forma até carinhosa as veleidades dos fãs desses beligerantes profissinais.

Em um momento Tom Hanks, pai de Troy na ficção também, surpreende o filho na saída de um dos espetáculos e tem uma morna abordagem, completamente frustrante perto da tirana e inflexível postura firmada no início. Troy é delido na segunda metade do filme tornando-se coadjuvante mesmo quando engata um insoso affair com Emily Blunt, uma relações públicas cobrindo o “novo grande número” de Buck Howard. O viés que ainda se mantém é o ceticismo de Troy sendo testado quanto aos segredos, truques ou real talento do emblemático mentalista, John Malkovitch, que não consegue sozinho salvar o longa mas distrai, com sua distinta e indômita interpretação, do fiasco que é The Great Buck Howard.

Where The Wild Things Are

25/01/2010

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Spike Jonze se mantém fiel a temática de isolamento da consciência do indivíduo assim como em Quero Ser John Malkovich (1999) e Adaptação(2002), mas em Onde Vivem os Monstros (2009) a alienação da mente adulta dá espaço a solidão da psique infantil.

Inspirado no livro de ilustrações homônimo de Maurice Sendak, muito disseminado no mercado norte americano, que o diretor diz sempre ter se identificado, “como se já conhecesse os monstros, inclusive a escala, o tamanho da cabeça, algo de primitivo neles”, Jonze foi fiel ao forma dos seres fantásticos mas foi além conferindo-lhes personalidades próprias e distintas e identificando os sentimentos de levados da realidade de seu protagonista como ressentimento, angústia, fidelidade, mesquinharia e incluindo outros psicologismos nas interações das criaturas entre si e com o jovem Max.

Carol, por exemplo, o monstro mais simpático e sensível, em um momento mostra à Max uma maquete de como seria seu mundo ideal, reiterando a espiral da solidão e o modo individual de lidar com situações adversas; essa é a fantasia de Max. Negligenciado pela irmã mais velha e o pouco tempo que recebe da atenção de sua mãe, Max se rebela numa acesso de raiva quando a vê com seu namorado e foge; nesta fuga,  velejando mar adentro, chega a uma ilha e se apresenta como rei, onde,  proclamado como tal pelos seres nativos, dispara: “Que comece a bagunça!”.

Até essa epifania anárquica o filme mantém a expectativa de deslumbre, seja pela crua densidade dos créditos iniciais ou pela imensidão e beleza das paisagens da ilha, mas, assim como seu reinado, essa expectativa vai ruindo quando se percebe que a força do filme está exatamente no imaginário visual de Max mimetizado melancolicamente em vastos cenários e onírica e elegíaca trilha sonora de Karen O., vocalista do Yeah Yeah yeahs, ex namorada de Jonze.

The Private Lives of Pippa Lee

03/01/2010

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Filha do dramaturgo americano Arthur Miller (ex marido de Marilyn Monroe) e esposa de Daniel Day-Lewis, Rebecca Miller dispôs de contatos suficientes para reunir Keanu Reeves, Winona Ryder, Julianne Moore, Monica Belucci, Alan Arkin e Robin Wright Penn na adaptação para o cinema de seu livro “The Private Lives of Pippa Lee“.

O longa que ainda teve como produtor Brad Pitt não vai além da premissa: muitos nomes; salvo atuação do casal protagonista e Maria Bello, a proposta do não-estrelismo do elenco casou com insipidez generalizada que é “A Vida Íntima de Pippa Lee” (2009). A tradução do título faz mais sentido que o original uma vez que o inconsistente e pretensioso roteiro volta no passado da diplomática e zelosa esposa do editor Herb Lee.

Em flashbacks pretenciosamente extravagantes, Miller conta a história do fantasioso nascimento de Pippa Sarkissian (interpretada na juventude por Blake Lively, a Serena de Gossip Girl, que aliás está muito bonita e consegue se destacar na sensaboria de outras atuações), sua conturbada relação com a mãe emocionalmente instável, uma vez viciada em anfetaminas, sua fuga para uma adolescência desregrada em companhia de artistas, drogas e festas até conhecer Herb, décadas mais velho, e se apaixonar pela forma carinhosa que ele a trata. O momento de frescor do filme é uma imprevisível trágedia que precede seu casamento e faz com que agora, Pippa Lee  assuma esse quase alterego de dedicada e exemplar dona de casa.

Após 25 anos de casados,  a debilitada saúde de Herb os fazem mudar para uma vida calma no subúrbio onde moram sua melhor amiga e o marido, amigo de Herb. A mudança desencadeia uma crise no casamento e no comportamento de ambos: a distância emocinal com os filhos, a traição da amiga, a chegada do vizinho recém-separado Keanu Reeves, culminarão na rendição de Pippa Lee. Assim, sem muita densidade e com um certo humor “…Pippa Lee” promete mais do que entrega.

Hanami

30/12/2009
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Nomeado ao Urso de Ouro em 2008, Kirschblüten -Hanami é impecável ao retratar com poesia e frescor redentores a odisséia de Rudi no Japão vivenciando os sonhos não realizados de sua recém falecida esposa.

Amante da arte e cultura japonesa, Trudi alimentava o desejo de conhecer o Monte Fuji através de postais, livros e pôsteres que decoravam sutilmente sua rotina no interior da Alemanha, onde escolheu sua vida zelando pelo esposo e filhos. O filme inicia com Trudi sendo aconselhada a viajar, aproveitar o pouco tempo de vida que foi diagnosticado para o marido, este, que sempre prezou pelo cotidiano seguro e segundo ela, não gosta de aventuras. Ainda assim o convence a visitar os filhos que moram em Berlim e que os recebem quase como incômodos visitantes fazendo o casal seguir para uns dias no litoral do Báltico, onde Rudi acorda viúvo.

A temática do “ninho vazio” e o abismo que rompe os pais e filhos adultos a quase desconhecidos estende ainda mais a solidão de Rudi, que só agora percebe os interesses e aspirações reprimidas enquanto repara os pertences da esposa e a leva, através de suas roupas e seus sentimentos, para a viagem que sempre sonhou. Já em Tokio, uma órfã dançarina de Butoh acompanha Rudi e a memória de sua esposa numa redentora jornada.

O feito de Hanami(2008) está na completude, na excelência de todos os quesitos cinematográficos onde é injusto deixar de ressaltar o apaixonante enredo, a madura e sensível direção de Doris Dorrie, de Männer…(1985), a exímia e poética fotografia, a elegíaca trilha de Claus Blantzer e as profundas e generosas atuações que entoam num primoroso uníssono. Um dos filmes mais belos do ano.

Un Fille Coupée em Deux

21/12/2009

Inspirado no real assassinato de um arquiteto nova-iorquino em 1906, o cineasta Claude Chabrol, assim como os outros personagens de “Un Fille Coupée em Deux”, usa a protagonista Gabrielle para conseguir o que quer, em seu caso, traçar uma crônica acerca da liberdade e dos limites da alta sociedade francesa. É, de fato, esse jogo de poder que delineia a trama.

A ambiciosa garota do tempo que parece saber exatamente o que quer, o renomado escritor Charles, um hedonista que não abre mão da parceria com sua complacente esposa, esta, que aceita as aventuras do marido para tê-lo, Paul, é o herdeiro de uma companhia farmacêutica que sempre consegue o que quer e sua indulgente mãe que se mostra ferrenha em nome da família. Quando essas vidas se cruzam o conflito de interesses é inevitável e trágico, os levando para o abismo do que lhes é inconcebível: a perda (da liberdade, do status, do poder, da companhia ou da própria vida).

As atuações divergem entre a comédia e a densidade, enquanto a protagonista Ludivine Sagnier se sustenta quase apática, seja na permissividade sexual de Charles, em seu frio relacionamento com o moralista Paul ou quando é divida em duas partes num epílogo circense, e particularmente, é essa pretensão sofisticada que faz de “Uma Garota Dividida em Dois”(2007) um filme bom e não excelente.

Two Lovers

20/12/2009

Em “Amantes“(2008),  o filho único de um casal de imigrantes volta para casa dos pais após um traumático término de noivado e sucessivas tentativas de suicídio. Donos da lavanderia onde o filho eventualmente trabalha forçam um romance entre Leonard e a filha do novo sócio, a sensível e plácida Sandra, inteiramente disponível e disposta a cuidar das profundas cicatrizes do personagem de Joaquin Phoenix.

Seu relacionamento com Sandra se desenvolve assim como sua ordinária rotina, seguindo o fluxo, enquanto sua inquietude e ansiedade parecem a ponto de transbordar. É um encontro casual com a nova vizinha, Michelle, que dá vazão aos extremos de Leonard.

Tempestuosa e imatura, Michelle é amante de um rico advogado que se divide entre a esposa e as noites em que a leva a ópera e sua relação com o Leonard remete ao enredo do romance “Noites Brancas”. Mas essa previsibilidade da trama é um detalhe, o triunfo de James Gray está na metáfora visual, um Brooklyn, visto do topo do prédio nas cenas mais densas e incômodas, com fria atmosfera da São Peterburgo de Dostoiévski.

A melancolia e a ansiedade emergentes das belíssimas atuações, como a de Isabella Rossellini na pele da mãe de Leonard, completam e coroam o belo e doloroso “Two Lovers“, que recebeu ano passado indicação a Palma de Ouro em Cannes, mérito de um maduro James Gray e seus Joaquins: seu protagonista e o diretor de fotografia Joaquin Baca-Asay.


The Limits of Control

16/12/2009

2009 parece ter sido o ano de grandes diretores que, consagrados, permitiram-se mergulhar em seus estilos e, apesar das acusações de autoindulgência, realizaram grandes filmes transbordando em suas respectivas idiossincrasias: Los Abrazos Rotos, Inglorious Baterds, por exemplo,  e The Limits of Control de Jim Jarmusch.

O diretor de Coffee and Cigarettes (2003)  apresenta um longa impecável e exaustivamente estruturado num jogo de belíssimas simetrias e assimetrias arquitetônicas. A narrativa é linear porém nada convencional, onde a crua contemplação estética é exaltada pela ausência de trilha e até mesmo ruídos e sons de uma cidade como Madri, resultando em substanciosa sofisticação.

Assim como em seus anteriores Dead Man (1995) ou Broken Flowers (2005), um roteiro sobre uma iniciação, viagem ou jornada pessoal, e como em Ghost Dog (1999), o protagonista é um assassino negro que segue uma filosofia oriental.  Isaach de Bakolé, com exímia silenciosa e compenetrante atuação, é o lobo solitário. Durante uma missão no “Velho Mundo”, é abordado, sempre com a mesma sentença, por diferentes personagens  com quem troca caixinha se fósforos. Gael García, Tilda SwintonJohn Hurt e Bill Murray são alguns nomes que figuram essas  personas que, em suas breves aparições divagam sobre música, cinema, ciência ou artes.

Esses fugazes encontros ressonam ao longo do filme sob forma de canção, pinturas e imagens aliás, a trama em si é unicamente construída de uma série de espirais de simbolismos, aforismos, referência culturais e questões filosóficas enquanto a ilustre câmera de Jarmusch acompanha o protagonista em escadas rolantes do aeroporto, em sinuosas e labirínticas escadas dos hotéis na Espanha, seus ritos e ritmos habituais, e novamente no aeroporto, esse é The Limits of Control: abstrato, subjetivo e impecável.  Glory to the Filmaker! como anunciou Takeshi Kitano.

The King of Kong

14/12/2009

Até quem baixou pensando ser King Kong(2005),  “do diretor de Senhor dos Anéis”,  surpreendeu-se com “The King of Kong: A Fistful of Quarters”(2007); tá, por razões óbvias o relato não partiu de um cinéfilo, mas de um aficionado por vídeo-game, e é o documentário em questão que coloca o geek e eu, lado a lado numa sessão virtual, em que ambos saímos satisfeitos(!).

Com uma edição nada sutil mas igualmente esperta e cativante, a disputa pelo maior score num arcade é contada sob um drama de superação tal, que o documentário é praticamente uma variante nerd de “Rocky [Balboa]” (1976). De um lado do ringue, Billy Mitchel, microempresário egocêntrico e mimado que apóia sua arrogância no título que recebeu na adolescência, de melhor jogador de Donkey Kong, e o fato de que 20 anos depois ninguém atingiu sua pontuação. Do outro, Steve Wiebe, frustrado por sempre ter sido quase o melhor em tudo que já tenha tentado, o pacato professor ginasial de ciências instala o arcade em sua garagem obstinado a quebrar o recorde de 1982. O expectador definitivamente compra a briga e se emocina com Steve e sua família indo contra os egos, estratagemas e perseguições numa disputa desleal contra o “sistema”, Billy e a Twin Galaxies, entidade que valida e registra esse tipo de ranking.

Dirigindo seu primeiro longa, Seth Gordon, foi visionário e genial ao colher (e escolher) todos os elementos necessários para criar uma trama emocionante: o mocinho, o cara mau e poderoso, injustiça, perseverança e a real importância das coisas. A narrativa dinâmica, divertida e deliciosamente refrescante, sem contar o tom quase surreal da grande maioria dos personagens que figuram o submundo dos games, a idolatria à Billy, os óculos, as reações e os depoimentos que permeam a briga pelo título, assim como imagens de algumas jogadas e animações bem posicionadas recheadas de didatismo, confere título de bom cinema para “The King of Kong“, que embalado pela atmosfera épica de Gordon e a resposta do público, está ganhando uma sequência ficcional.

as cores de Almodovar

12/12/2009

Harry Caine nasce depois do acidente em que Mateo Blanco perde um grande amor e a visão; o pseudônimo roteirista ocupa por completo a vida do diretor por catorze anos até que seu passado o reencontre e Mateo possa tocar a imagem de sua amada. Poético,  grandioso,  Almodovar.

Repetitivo ou fiel ao seu estilo dividem os que reduzem “Los Abrazos Rotos”(2009) como não sendo a melhor película do diretor e os que o veneram. É fato que o homosexualismo, as paixões súbitas, a corrupção (da alma), o moralismo, as dores, a tragédia e Penélope Cruz estão presentes, mas dessa vez as (auto) referências e reverências metalinguísticas protagonizam esse espelho de sua obra, assim como (literalmente) de sua musa, com capciosa propriedade quando há dificuldade em dizer se essa ode sobrepuja a trama.

Desenhado numa narração menos tempestuosa e apoteótica que seus antecessores todavia acompanhado da evolução de sua assinatura, a expressão visual: sempre vibrante e cada vez mais sofisticada; é, na verdade, esse vigor das cores de Almodovar que confere a grandiosidade de Abraços Partidos“.

Sunshines

09/12/2009

Quem gostou de “Little Miss Sunshine”(2006) não vai se decepcionar com “Sunshine Cleaning“(2008).  Nomeado ao grande prêmio do Júri ano passado em Sundance, o longa é anunciado por ter os mesmos produtores e as semelhanças vão além do título.

A duologia Sunshine tem o mesmo ator, Alan Arkin, fazendo o mesmo papel do avô complacente e encorajador da criança peculiar em questão: Oscar, um garoto com problemas de comportamento constantemente subjugado por seus professores; é aí que a protagonista decide mudar o filho para uma escola particular. Amy Adams, que comprova sua compêtencia do blockbuster ao indie, é mãe solteira do pequeno Oscar.

Popular ex líder de torcida, Rose agora faz faxinas nas mansões daquelas que a invejavam quando adolescente, seu namorado do colégio, o cobiçado jogador de futebol americano, hoje a mantém numa relação fora do casamento. À margem da sociedade, a endividada Rose mantém o otimismo entoando mantras de auto-ajuda e convence a irmã recém-desempregada a juntar-se a ela numa inusitada e rentável oportunidade: executar limpeza de cenas de crime. Compram um velho furgão que recebe status de profissionalismo com a logo da empresa: “Sunshine Cleaning”, e em trâmites burocráticos conhecem outro personagem ‘underground’, o vendedor da loja de produtos químicos, que configura o quinto elemento da trama pessoal de Rose.

A morte, a esperança, a aceitação pessoal e social, a reflexão acerca do sucesso e da felicidade são abordados com um pouco mais de profundidade pelas lentes de Christine Jeffs, dos dramas “Rain”(2001) e “Sylvia”(2003), numa obscuridade mais explícita do que em “… Miss Sunshine”, que faz com que os risos do expectador sejam seguidos de um certo desconforto, uma censura complacente.

The Hangover

09/12/2009

Talvez a comédia não seja um gênero que aparece com frequencia por aqui já que são poucos os filmes a que dou uma chance, confesso, e o trailler de  “Se Beber Não Case” evoca o clichê da tradição estadunidense de casar uma despedida de solteiro e Las Vegas, daí já se espera muitas rodadas de bebid, strippers e o que mais agradaria um adolescente do sexo masculino, mas fui surpreendida logo no início quando o roteiro deixa de fora a festa em si.

Doug parte para Las Vegas com seus dois melhores amigos, o imaturo, sarcástico  professor Phil (the very sexy Bradley Cooper) e o quadrado dentista controlado pela namorada Stu, e seu estóico-desprovido-de-traquejo-social ( e que rouba todas as cenas) cunhado, o simplesmente hilário Alan (Zach Galifianakis), instalam-se numa suite luxuosa e após o primeira brinde, assim como para a consciência dos protagonistas, a cena seguinte são os padrinhos acordando num cenário completamente destruído e empossado de itens inéditos na noite anterior como por exemplo um trigre no banheiro e um bebê no armário, e outros que faltam, como um dente de Stu e o noivo(!), a partir daí “The Hangover“(2009) explora a ressaca dos personagens tentando recontruir o que aconteceu, onde estiveram e o que fizeram na noite anterior para tentar achar Doug e chegar a tempo do casamento, uma empreitada ágil, extremamente divertida, nem de longe a tortura que previ. Merecido Globo de Ouro.

Brand Upon the Brain!

08/12/2009

A exibição de “Brand Upon the Brain!”(2006) no 57º Festival de Berlim foi um evento a parte. Acompanhado da Orquestra Volkswagen e narração vibrante de Isabella Rossellini, o longa do canadense Guy Maddin foi ovacionado no Deutsche Oper Berlin.

Lírico e expressionista,  o eletrizante suspense mostra o retorno do jovem Guy à misteriosa ilha onde passou sua infância morando em um farol e revive a trama desprendida da chegada de dois jovens detetives guiados pela sombrio das relações opressivas da família de Guy. O protagonista ainda nutre um complexo de Édipo ao passo que sua irmã desenvolve um relacionamento homossexual com um dos recém-chegados a ilha. Maddin, do fantástico e excêntrico “The Saddest Music in the World”(2003) protagonizado por sua musa Rossellini  consegue em “Marcado Na Mente” recriar em definitivo a urgência do nascimento do cinema.

Eu queria colocar na tela os efeitos literários. Eu gosto do modo que a leitura de uma metáfora perfeita produz efeitos quase narcóticos“, e segue dizendo que aceita a qualificação de ‘experimental’ de seus filmes por não serem comerciais ou apenas divertidos. Isso, de fato, não são.

Atividade Paranormal

05/12/2009

Entusiasta de filmes de terror desde sempre, lembro a última vez que me surpreendi numa sala de cinema, foi com “O Chamado” (2002), ali eu estava sentindo um medo de verdade durante toda a novidade que seria a abertura para uma nova safra de remakes e os coreanos em si, que de alguma forma imaginaram que cabelos saindo do teto seria algo assustador. Pessoalmente foi uma revolução. Ontem eu tive a mesma sensação com “Atividade Paranormal”(2007), quando vi desde o início que não ia mesmo levantar pra pegar um copo d’agua sozinha a noite por um tempo.

O filme segue a base de “Bruxa de Blair” (1999) como um suposto documentário e narrativa ‘caseira’, mas essa não-novidade não descontrói o suspense, nem o apelo aterrorizante de um contexto universalmente identificável, o lugar comum, objetos, os personagens, sem teorias além do cotidiano. Micah compra uma câmera e investe num aparato tecnológico na tentativa de registrar estranhas atividades que voltam q assombrar sua namorada, que relata um histórico prévio com alguma entidade sobrenatural. Portas batendo, ruídos estranhos e objetos derrubados sem explicação, Micah está disposto a registrar alguma atividade paranormal e mantém a câmera ligada 24 horas por dia acompanhando o casal.

A introdução de um agradecimento fictício a família de Micah e a polícia local criam a tensão necessária ainda que somente pela dúvida de se realmente tratarem de fatos reais. Outro fator é a exibição no cinema em si, ampliando os sentidos e o diretor estreante Oren Peli se aproveita disso induzindo para uma veracidade tal que por alguns momentos pensei seriamente em sair da sala tal foi o medo no decorrer das noites do casal; parece exagerado, mas esse conjunto de simples elementos funcionam bem nesta intensidade.

O final foi mudado para que deixasse margem à continuações, na verdade o único desvio é exatamente o último segundo, que assusta, mas escapa da atmosfera ‘comum’ e crível que é a grande fórmula de “Paranormal Activity“, que se tornou um dos mais lucrativos da história, já arrecadou mais de 60 milhões de dólares, sobre os míseros 15 mil da produção.

Un Secret

04/12/2009
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Um Segredo em Família (2007) de Claude Miller foi o filme escolhido para a sessão de abertura do filme da abertura do 8º Festival Varilux de Cinema na última segunda-feira. O longa integra a programação do Festival  que começa hoje  até o dia 10 de dezembro em 12 cidades brasileiras.

O cineasta francês, de “A Pequena Lili” (2003), apresenta inicialmente um filme moderno sob a narração do protagonista François numa dinâmica que alterna o surrealismo de sua infância acompanhado de um irmão imaginário (que remete ao espanhol “A Espinha do Diabo” (2001)) e lembranças de lugares e estórias das quais nunca vivenciou com o refrescante recurso do flash-forward em preto e branco para sua rotina adulta; a trilha de Zbihniew Preisner, premiado compositor dos filmes de Krzysztof Kieślowski, edifica uma atmosfera densa para o que parece ser o enredo de um íntimo drama pessoal.

Tão breve esses artifícios dão lugar a uma narrativa acadêmica onde a união de seus pais é construída sob o plano de fundo da II Guerra. Nesses outros dois terços do filme, os protagonistas são os pais de François, que conheceram-se na condição de cunhados, e tem seu casamento possibilitado por uma tragédia consequente direta da deportação dos judeus durante a guerra. Miller disseca suas personagens testadas em seu cotidiano invadido pelo anti-semitismo na França permeando os clássicos temas de amor, perda, desejo, ciúme e culpa, quase outro filme.

No entanto, as atuações soberbas e o preciso mise en scène junto com uma fotografia impecável abrandam o excesso de elaboração na dança dos espaço-temporais, culminada num insoso e apologético epílogo, e conseguem sustentar a grandiosidade cinematográfica em Un Secret.

Låt den Rätte Komma In

28/11/2009

Cinema é simbiose, uma experiência nao passiva pelo espectador, é uma experiência individual, mas nao só isso, temos momentos, fases diferentes. Muitos criticaram pelo meu cansaço com A Partida, mas pessoalmente, depois do Festival do Rio e Mostra de Sp, muitas fitas de diferentes nacionalidades, diferentes gêneros, a previsibilidade de enredo, de efeitos, é desgostosa, tenho buscado uma sensaçao de novidade, de refrescância, e Deixa Ela Entrar (2008) me ganhou.

O primeiro passo para tal é fugir  da premissa de ser um filme sobre vampiros. Tema que, por sinal, me agrada muito desde a pré adolescencia recheada de RPG, e assistindo os insuperáveis Drácula (1992) e Entrevista com o Vampiro (1994), mas a excelência no gênero permaneceu nesta safra early nineties. Da nova remessa vampiresca  nao me convenço a falta de sofisticaçao e palidez de Blade (1998), que também reduz o gênero à açao como em Vampires (1998) de John Carpenter;  Sede de Sangue (2009) é um bom filme mas tem a condiçao do vampiro associada a sintomas virulentos e, diferente de Daybreakers (2009) protagonizado por Willem Dafoe e Ethan Hawke, nao pretendo assistir a so called “saga” Crepúsculo.

Låt den Rätte Komma In é diferente: a temática é o plano de fundo para um enredo sensível, uma estória de amor romantico de duas crianças com o preconceito, o abandono e a marginalidade em comum. A violência é de certa forma desbrutalizada pelo scope e as paisagens particulares do cinema sueco. A refrescância, a delicadeza e a originalidade do enredo fascinam, e a cena ápice (da piscina) imediatamente entrou para uma antologia pessoal por culminar todos esses fatores abordando a vingança e brutalidade com recursos indiretos.

O conjunto da obra é excelente sem afetaçoes, e, retomando ao começo do post, essa novidade que anda tao rara, o encantamento da arte do cinema é o deleite de Deixa Ela Entrar.

Okuribito

26/11/2009
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Um violoncelista desempregado retorna a sua cidade natal e esconde da esposa e conhecidos sua atual atividade (bem) remunerada. Em A Partida (2008), Daigo Kobayashi começa a trabalhar como assistente de um preparador funerário, profissional que veste o defunto para o velório e diante do luto alheio, em sutilezas, descobre um certo orgulho e auto satisfaçao no idiossincrático cerimonial.

Na espera de um denso e linear drama japonês, o longa pode ser frustrante pelo viés pastelao que insiste em caras e bocas novelescos do protagonista e sua robótica ‘housewife’. Nao é de todo mal, a fotografia remete o personagem nokanshi a uma espécie de Amelie Poulain japonês e o diretor Yôjirô Takita consegue criar momentos tenros e sutis apreciáveis ainda que o espaço entre esses momentos seja enfadonho.

Talvez a plasticidade no tratamento das relaçoes e as pinceladas de humor ingênuo que desviam Okuribito da fatalidade densa de se falar sobre morte, luto e perda tenha refrescado alguns espectadores desta fita, premiada com o Oscar de Melhor filme Estrangeiro 2009, mas a performance televisiva optada nao é suficiente para agradar os amantes dos dramas japoneses críveis e orgânicos.

Antichrist

19/11/2009

Lars Von Trier tem originalidade e autoria, num momento em que a quantidade de fitas produzidas se multiplica é difícil que a qualidade acompanhe. Houve uma época em que o roteiro tinha o peso da minha preferência pessoal, mas depois de alguns anos e muitos filmes, uma maneira refrescante e ousada de se contar uma estória é o que tem me deleitado acima de outros critérios cinematográficos. E neste momento eu vibro arrepiada e absorta com “O Anticristo“, em que muito se falou de cenas chocantes e gratuitas de sexo e violência desde sua apresentaçao em Cannes este ano. Sim, o longa tem cenas fortes e intensas, porém gratuidade nao houve, o oposto, sublimam em força, beleza e verve. Em 6 segmentos, “Antichrist“(2009) nao deixa uma pausa para respirar, é maravilhamento ou perplexidade.

O Prólogo, momento que antecede a morte do filho dos protagonistas, é certamente uma das coisas mais belas que já vi, uma obra de arte. Os quatro capítulos posteriores seguem uma estética distinta: Grief, Pain (Chaos Reigns), Despair (Gynocide) The Three Beggars contam o marido psicanalista trabalhando para curar o desesperador luto da esposa a partir seu retorno para casa depois de semanas a fio sedada em um hospital, diferentes e melindrosas abordagens psicanaliticas sao descritas de forma poética, histérica e desconcertante e atingem o auge no momento em que o casal liberta a oculta e sinistra psique da personagem de Charlotte Gainsbourg. Willem Dafoe a acompanha em sua densa e insigne interpretaçao, e deixa sobreviente o Éden no delicado e redentor Epílogo.

Os diferentes recursos técnicos e estéticos tao pouco podem ser reduzidos ao experimental, sao eles que integram em sinestesia e profundidade a obscuridade do instintivo e do psicológico humano: a ansiedade, a culpa, o niilismo,  a mitologia, a fecundidade, a perda, a libido, a sobrevivência, a tortura, a tragédia intrínseca da natureza. Arrebatador.

Belle de Jour

17/11/2009

Sob perfeito tagline de “Luis Bunuel’s Masterpiece of Erotica!“, o substancioso e fascinante Belle de Jour (1967).

Numa narrativa inquietante, a jovem Catherine Deneuve, ímpar na pele de Severine, é esposa de um cirurgião a quem ama mas rejeita sexualmente, enquanto nutre pensamentos eróticos e escapistas com outros homens, até que sua inquietude e insatisfaçao a conduzem diariamente a uma maison no período em que seu marido está no trabalho: A Bela da Tarde, altergo realizador de suas fantasias.

Entre seus clientes um industrial masoquista, um asiático sodomista, um duque necrófilo, e o jovem marginal Marcel, personagem que seria um antecessor de Alex Delarge, exceto pela misoginia do protagonista de Laranja Mecanica (1971), mas igualmente contraventor e volátil que se apaixona doentiamente por A Bela da Tarde. Esse automatismo surrealista de Marcel, ainda que de forma desesperadoramente violenta e gratuita, acaba por sublimar a liberdade de Severine e salvar seu casamento.

O Invasor

15/11/2009
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Dois empresários procuram um matador de aluguel para executar um terceiro sócio, na fugaz ilusao de que suas maos estao limpas. Livram-se do fardo e ganham a presença constante e sufocante daquele que lhes mostrara que a consciencia é, em si, julgamento e sentença.

Marçal Aquino, autor do livro homonimo, é o ponto alto do longa, que de forma angustiante permea o zeitgeist da metropole e encerra a trama concluindo os círculos e vícios pessoais dos agentes que manufaturam o sitema metropolitano sobre si. O Invasor, pelas lentes de Beto Brant apresenta sem ousadia uma fotografia e densidade bem conhecidas e identificáveis nas fitas latinoamericanas. O longa de 2001 foi premiado em Sundance no ano seguinte na categoria de melhor filme latino-americano.

Paulo Miklos reina interpretando o personagem invasor de forma esteriotipada mas crível, ainda que olhe para câmera. A atuação de Marcos Ricca [que interpreta um dos sócios] sobressai a de seus coadjuvantes.

Tokyo!

13/11/2009

O já conhecido e ovacionado Michel Gondry, juntou-se a outro diretor francês, Leos Carax e ao sul coreano Joon-ho (diretor de “O Hospedeiro”) para escrever e dirigir uma verdadeira bomba!.

Gondry é responsável pelo morno segmento Interior Design, onde uma garota sentindo-se sozinha em seu relacionamento, acaba-se por transformar-se “em uma cadeira”. O bizarro (no mau sentido) e gratuito segmento de Carax mostra um caucasiano desgrenhado saindo dos bueiros e indo de encontro a prisão por seu comportamento terrosrista(!), dá vontade de sair da sala e acaba com qualquer ânimo que sobrasse para Shaking Tokyo, do diretor coreano, onde um recluso apaixona-se por uma entregadora de pizza que desmaia a sua porta durante um terremoto. Na verdade os seguimentos ímpares apresentam sintonia, falam de solidão na metrópole de forma sensível e abstrata, o problema é a logística de ser o seguimento posterior a Merde, que esgota psicologicamente e faz com que não apreciemos Shaking Tokyo como deveríamos.

Tokyo! foi descrito como “permeado pelo bizarro, ou melhor, pelo fantástico”. Mas acaba mesmo é por provar que 3 bons diretores podem fazer um filme ruim.

A Morte lhe Cai Bem

12/11/2009

No vestígio de clima de Mostra inauguro aqui no blog a categoria ‘Filmes da Minha Vida’. Essa semana  reassisti uma das fitas mais carimbadas na minha ficha da locadora nos anos 90, uma que na capa tinham um cara segurando um cadelabro atraves de um buraco na barriga de uma mulher de branco e outra de vermelho com pescoço virado. Eram Bruce Willis, Goldie Hawn e Meryl Streep, os protagonistas de Death becomes Her (1992).

Depois de perder o noivo para a amiga, Helen reaparece deslumbrante e retoma o affair com o Ernest e, juntos, planejam assassinar a esposa. Enquanto Madeline só está preocupada em desvendar o mistério da beleza e jovialidade da rival. O segredo do elixir, comercializado pela exótica e desnuda Isabella Rossellini acabará por condenar as duas a dependerem uma da outra pela eternidade.

A comédia permeada de humor negro,  ainda que pela enésima vez, manteve a credibilidade dos divertidíssimos efeitos especias que tanto me cativaram quando eu tinha dez anos de idade e que, aliás, receberam o BAFTA e Oscar em 93 nesta categoria.

Parábola das Gaivotas

12/11/2009

Aos 73 anos, o diretor inglês Ken Loach apresenta um filme delicioso de assistir; transitando entre a depressão, a violência, a lealdade, os laços de parentesco, expectativas e desilusões, complacência e redenção com incrível frescor. As asperezas e as “lembranças mais bonitas” da vida são traduzidas por Loach com ritmo equilibrado sem excesso de recursos cinematográficos para o induzir o espectador e permite os créditos de Looking for Eric“(2009) para o roteiro de Paul Laverty.

A trama é bem elaborada, despretensiosa e sem fatalidade de gênero. Refrescante e original, faz rir, emocionar, envolver-se, apreciar, e refletir; refletir sobre seu próprio cotidiano, escolhas, erros e acertos: é impossível não reponder instantâneamente à retóricas como “Quando foi a última vez que você foi feliz?” e “Você já fez algo que se envergonhasse ?”, assim como outras máximas do personagem Eric Cantona, interpretado graciosamente pelo próprio jogador de futebol.

Cantona aparece como ícone de autoconfiança, sucesso e realização pessoal para o protagonista: um ex-dançarino de rock que abandona sua primeira mulher com um bebê quando jovem e que, anos após ser deixado pela segunda esposa, encontra-se frustrado com seu emprego de carteiro e a permissividade cultivada pelos dois enteados. Eric tem como momentos escapistas da mediocridade e insatisfação, as vibrantes partidas de futebol, a euforia e extase que seu ídolo francês proporcionou em sua brilhante passagem pelo Manchester United. O filme alterna ficção com os belos lances reais executados por Cantona, o que deleita espectadores amantes do futebol e deixa o filme mais dinâmico e fácil de gostar.

A partir daí Cantona é um ‘personal motivador’ com suas máximas, frases de efeito, e toda cartilha que poderia ser enxugada de qualquer e todo livro de autoajuda. Começando pelas mais simples decisões como barbear-se e a cada passo entrar mais fundo nas questões individuais escondidas, guardadas ou bloqueadas e libertando esses fantasmas e recuperar o poder de mudar, ao menos, o universo pessoal. no caso de Eric, a relação reconstruída com a mãe de sua filha, a redenção de seus enteados, os riscos assumidos que se tornam possibilidades e a valorização e lealdade dos amigos próximos. Saímos da sessão entretidos e certamente mais otimistas.

Quem conferir o longa pode aguardar nos créditos finais a verídica “parábola das gaivotas” evocada pelo ex-jogador numa coletiva de imprensa, fato que inspirou sagazmente o roteirista indiano.

“This Is It”

09/11/2009

Ex advogado quer honorários, o pai exige pensão, os irmãos estão a vender homenagens, todos continuam, postumamente,  a sugar  o talento de Michael Jackson, mas se essa era exclusivamente a intenção de Kenny Ortega com “This Is It” não transpareceu.

Ortega foi o coreógrafo de Dirty Dancing(1987) a High School Musical 3 (2008) e premiado por clipes como Material Girl da Madonna, criou o design de “Dangerous World”, que passou por São Paulo em 93 (eu estive lá),  e “History World” (1996-97), e repetia a parceria com Michael no que seria sua derradeira turnê. Os ensaios e preparações para as apresentações, porém, documentados pela produção, da escolha dos ubber dançarinos aos testes pirotecnicos, e claro, bastidores, viraram um filme. Dirigido por Ortega, “This Is It” é essencialmente um presente para os fãs.

A aparência frágil e cadavérica de Michael Jackson quase impressiona não fosse o poder da sua voz e o magnetismo de suas coreografias. De temperamento maestral,  Michael aparece completamente envolvido com todo e cada aspecto, cada detalhe, sempre preocupado em proporcionar ao público a sublime e grandiosa “experiência do escapismo”, e não aceita menos que a perfeição, ao mesmo tempo, uma figura doce, altruísta, envolvida com as pessoas que os cercam, dos bailarinos aos instrumentistas.

No filme pode-se conferir desde os aparatos mecânico do palco, de elevadores, impulsores, uma gigante aranha mecânica, um imenso trator, a já conhecida grua que leva Michael por cima da platéia em “Beat It”, as produções cinematográficas que acompanhariam “Thriller”, “Smooth Criminal” e “They Don’t Care about Us”, a incrível sincronia de suas  coreografias, a parte do show dedicada ao ‘Jackson’s Five’, e entre outras tantas cenas de bastidores, particularmente, uma, em que o diretor se preocupa como marcar um momento de Michael com a platéia, ele diz “eu vou sentir”.

This Is It“(2009) é uma experiência e tanto: mérito absoluto do protagonista.

“Cinzas e Sangue”

06/11/2009

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Fanny Ardant, conhecida por Maria Callas em Callas Forever(2003), foi companheira e  musa de Truffaut, com quem teve uma filha dois anos antes da morte do diretor francês,  protagonizando seus dois últimos longas The Woman Next Door(1981) e Confidentially Yours(1983), fiéis a temática de paixões,  mulheres, infância e fidelidade, assuntos que Ardant retoma em seu primeiro longa “Cendres et Sang“(2009), assinando roteiro e direção.

A fita segue a trajetória de uma viúva romêna exilada em Marselha com os três filhos ao aceitar o convite para o casamento da sobrinha apesar dos receios e segredos do passado. Seu dramático retorno desencadeia um misto de ritos e ódios calcados nas relações entre três famílias rivais, que acabarão por encontrar a tragédia.

Mais do que um enredo misterioso e obscuro emaranhado em clãs, tradições e rituais, o encantamento do espectador internacional é fruto principalmente da marcante presença da protagonista Judith, uma mulher visceral, passional, que tem em cada filho uma extensão de sua personalidade, a destemência em Pashko, o carisma em Ismael e sagacidade na pequena Mira. 

A apreciação dos planos e a vivacidade de personagens contidas pelas formalidades , é instantânea, e a nebulosidade que pode aparecer na demarcação das genealogias de Cinzas e Sangue parece corresponder a uma assinatura de Ardant, que nos créditos finais entrega a árvore dos clã de forma gráfica e esclarecedora.

(500) Dias com Carla Bruni, Regina Spektor, Feist …

06/11/2009

Mark Waters, que depois de dirigir pérolas como “Cinco Evas E Um Adão”, fracasso com Freddie Prinze Jr, e os cafonérrimos: remake de Freak Friday e Mean Girls com Lindsay Lohan, procurou refinar-se no gênero das comédias romanticas e também em seu casting, diga-se de passagem, obtendo sucesso com “Just Like Heaven” com Reese Witherspoon e Mark Ruffalo e “Minhas adoráveis ex Namoradas” Matthew McConaughey. E com toda essa bagagem apostou na produção de 500 Dias com Ela que é o début do diretor Marc Webb em longa metragens.

Webb é conhecido por seu trabalho como diretor musical, assina, por exemplo, dvds do Green Day, 3 Doors Down e tantas outras bandas que vão de Santana a My Chemical Romance, e este é o know-how que traz para o filme: uma trilha sonora recheada de artista cultuados como: Regina Spektor, The Smiths, Feist, The Clash, Doves, She&Him, Wolfmother, a primeira dama francesa Carla Bruni e até “She’s like the wind” de Patrick Swayze .

500 Days of Summer(2009) conta a história de Tom (Joseph Gordon Levitt), que atraves de flashbacks e flashfowards tenta entender o que deu errado em seu relacionamento com Summer (Zooey Deschanel ). Desde sua exibição na Seleçao Oficial de Sundance 2009, a comédia romântica tem sido bastante elogiada pela crítica, assim como a química entre os protagonistas, que pode ser conferida no clipe acima: “Why Do You Let Me Stay Here?” da banda She & Him.

Almodovar After Chanel

05/11/2009

Já no circuito Coco Before Chanel traz a musa cult Amelie Poulain aka Audrey Tautou na pele de Grabrielle “Coco” Chanel antes da fama. O filme mostra da infância a sua juventude como cantora de cabaré bem como seu envolvimento com Étienne Balsan e o jogador de pólo Arthur “Boy” Capel, ambos relacionamentos determinantes para que a carreira de Gabrielle seguisse para a moda.

Outro longa figura na programação da Mostra Coco Chanel & Igor Stravinsky, que foi escolhido para encerrar o Festival de Cannes este ano, narra outro momento na vida de Chanel: seu intenso e complicado relacionamento com o (casado) compositor russo Igor Stravinsky.

Os cinéfilos fashionistas também podem vislumbrar-se mais da grife francesa emLos Abrazos Rotos, do Almodovar, onde todo o figurino da personagem de Penélope Cruz é composto por peças de diversas coleções da Chanel.  Não é a primeira vez que o diretor espanhol “desfila” a grife: em De Salto Alto e Tudo Sobre Minha Mãe, as personagens fazem uso de bróches, bolsas, vestidos, sem faltar o icônico tailleur de tweed da Chanel.

Cerejas e Ovos

04/11/2009

Nos créditos iniciais, a fotografia preto e branco casou com o maquinário da cena, era promessa de um filme excelente: um operário, em meio a fumaças, ruídos e cinzas prende a mão e perde alguns dedos.

A cena seguinte segue sendo ponto alto do filme: operários durante o almoço comentam a intencionalidade (ou não) da amputação voluntária pela indenização. Ouve-se os comentários mas não se vê rosto algum: o plano horizontal são as mãos sobre as bandejas e os movimentos usuais de uma refeição, que funcionou muito bem. Mas num segundo momento, esse recurso de descentralizar a tomada causa constrangimento ao mostrar um homem com uma britadeira sacudindo enquanto o casal protagonista conversa no canto da tela, e acaba a áspera beleza por aí.

O  ‘resto’ do filme trata a estória de Reza, operário que foi deixado pela esposa e sentenciado a pagar pelo divórcio a quantia recebida pelo dote; ele então, sem saída e sem recurso algum para conseguir o dinheiro, ao encontrar com o funcionário indenizado, tem uma idéia nada saudável.

Relativamente curto, “O Homem que comia Cerejas” (Irã/2009)é recheado de longas cenas que acompanham pedaços simplórios da rotina dos recém divorciados: em três delas Reza prepara desanimadamente seu jantar sempre fritando ovos e comendo enlatados, são em demasia monótonas. Mas as cerejas posteriormente aparecem, em cores.

“Mardi ke gilass hayash ra khord” participa da Mostra na categoria “Perspectiva Internacional” e se dependende exclusivamente da minha nota no final da sessão não levava.

“Away We Go”

02/11/2009

Além de marido de Kate Winslet, foi o diretor do ovacionado “Beleza Americana“(1999), que ganhou status obra-prima ao retratar o ‘sonho americano’; bem isso é feito em grande parte dos blockbusters, mas o que se veria depois é que esse efeito ‘cult’ é a assinatura de Sam Mendes.

Soldado Anônimo“(2005) também não é apenas um filme de guerra, mas um polêmico retrato dos jovens soldados enviados a lugares inóspitos sem entender contra o que estão lutando e pelas lentes de Mendes sobrevivem à hostilidade munidos de humor negro e o sarcasmo. O mesmo efeito salta em “Estrada para Perdição“(2002) e “Foi Apenas um Sonho“(2008), transformar roteiros medianos em filmes ‘cult’.

Não é diferente em “Distante Nós Vamos“(2009), onde um casal bazalquiano sem sólidas conquistas profissionais e pessoais estão esperando seu primeiro filho. E na busca de amigos ou parentes para dividirem essa experiência, viajam para algumas cidades e descobrem as idissincrasias de outras famílias ao passo que descobrem a si mesmos como uma própria.

Com rostos bem conhecido do grande público, como Jeff Daniels, Maggie Gyllenhaal, Jim Gaffigan, Maya Rudolph, o filme é recheado de clichês e esteriótipos mas que acabam tendo toda graça, leveza e ‘intelectualismo’ que só o diretor é capaz de transformar.

“Amor en Tránsito”

31/10/2009

Numa sessão de sábado a noite lotada, o diretor/roteirista e o roteirsta/produtor apresentaram “Amor en Tránsito“, que não diria ser (apenas) o primeiro longa de Lucas Blanco (a cara do Andy Garcia, na imagem a cima dirigindo a atriz Verónica Pelaccini), e tive oportunidade de dizer isto a ele após a sessão.

Filme argentino é sempre sinônimo de sensibilidade, filmagens internas, romances e relações(e dramas) interpessoais tratados com delicadeza e envolvimento particulares. Neste caso, Blanco podia facilmente justificar as internas com a temática intimista, mas contou que são mais baratas mesmo. Ainda assim, apesar de excessivamente movimentadas na primeira parte do filme, essas tomadas dão uma assinatura ímpar a história de quatro personagens, dois homens e duas mulheres que chegando ou partindo de Buenos Aires envolvem-se em romances intensos e de futuro incerto.

O aeroporto da capital argentina é o tabuleiro onde as ‘peças’ são apresentadas e as partidas marcadas dão tensão as relações desenvolvidas. Os excelentes diálogos são outro ponto alto. Uma reviravolta une as histórias contadas paralelamente de forma a não confundir nem direcionar.

Amor em Trânsito” é, de fato, uma passagem, uma viagem, um breve momento na vida dessas quatro pessoas sem encerrar as opções de felicidade ou fuga. O fim do filme é o início do tabuleiro, e a mesma narração no final é recebida com outra (mais reflexiva) perspectiva. Fiquei encantada.

“Desperados On The Block”

30/10/2009

O polonês Tomasz E. Rudzik teve a inspiração para filme de sua experiência pessoal morando em blocos de muitos apartamentos na Alemanha, quando despertou para a quebra do individualista desinteresse pelos tantos rostos e expressões encontradas no subir e descer de um elevador.

Em “O Bloco dos Desesperados“, as lentes acompanham (em diferente ‘timming’) a vida de três moradores estrangeiros em sua busca pessoal por algum tipo de aceitação, seus estratagemas e sensações causados por essa ânsia (instantaneamente identificável) de conectar-se: uma romena evoca os mandamentos na tentativa de obter uma resposta divina, um jovem chinês apaixona-se por sua rebelde aluna particular e vindo da Letónia um surdo-mudo propõe a uma garota passar um dia inteiro juntos sem dizer uma palavra.

Uma festa reúne os moradores em seus momentos de maior frustação e funciona como subterfúgio, é o ápice dramático do filme, mas acompanhado da fugacidade desse momento aparece a possibilidade de redenção, ainda que sem muito otimismo, mais no estilo “a vida segue”.

Tratar de dramas fortes sob uma perspectiva serena é o mérito maior de Tomasz, além de excelente fotografia e trilha que acompanham a densidade, sutileza e beleza de  “Desperados On The Block“.

“It Might Get Loud”

29/10/2009

Essa é a cena inicial do filme: Jack White num ambiente bucólico munido de uma par de pregos, uma garrafa de vidro, um pedaço de madeira, fio metálico e um amplificador improvisa um instrumento e dali tira um som e lança: “quem disse que você precisa comprar uma guitarra?”

No documentário “A Todo Volume” Davis Guggenheim explora as raízes musicais, o início da carreira, as predileções e estilos pessoais dos guitarristas do Led Zepelin, U2 e White Stripes e promove um encontro entre os músicos, com a proposta de falar de guitarras elétricas.

O veterano Jimmy Page chama de “guitarra intervention” o fato de antigos proprietários terem deixado uma guitarra na casa para onde sua família mudou quando jovem. Ainda sem muito conhecimento teórico, Jimmy chegou a se apresentar em um programa de tv fazendo skiffle ( melodias simples e rápidas, popular na década de 50, parecido com rockabilly), e quando o apresentador pergunta se ele pretende ser um astro do rock quando crescer, Jimmy responde que quer ser biólogo. Em outro momento fala da necessidade de “Stairway to Heaven” de uma guitarra de dois braços , uma só para o solo.

The Edge aparece como o mais nerd no que diz respeito a processadores elétricos e o aparato de hardware envolvido. Aos 14 anos fez uma guitarra do zero, do talhar a madeira ao jogo de ímã “Não era a melhor guitarra do mundo, mas funcionava”. O guitarrista volta ao prédio de ciências da escola onde se reunia com os outros integrantes do U2, e fala da composição de “Sunday, Bloody Sunday”.

Jack White coloca um vinil de blues, apenas voz e palmas, e certifica a atitude rock’n roll daquela que classifica como sua “canção preferida”: “um homem contra o mundo”. Jack improvisa, para fazer música é necessário conflito e paixão, como o blues, é o mais artesanal dos três guitarristas. Aparece fazendo solo com os dedos sangrandos numa apresentação do Raconteurs.

O documentário, muito bem executado e editado, permea a história pessoal e cenas do encontro dos três tocando juntos e trocando experiências.  Dá vontade de ficar por ali curtindo por no mínimo mais duas horas.

“J’ai Tué Ma Mère”

28/10/2009

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O título, o idioma, a edição, o protagonista, roteirista e diretor de “Eu Matei Minha Mãe“(2009) são ‘franceses’ de Quebec, mas isso realmente é só um detalhe. Aos 20 anos Xavier Dolan  apresenta seu primeiro longa e tem talento, de sobra.

O filme conta o desprezo do jovem Hubert pela mãe, o estilo cafona, a mediocridade intelectual e seus trejeitos sufocam o jovem que se refugia na casa do namorado e de sua descolada mãe, que namora caras mais novos e aprova o relacionamento do filho com Hubert.

Dolan, entre mostrar o que sabe fazer e a sede de encontrar uma assinatura pessoal, acaba por sobrecarregar o filme com diferente recursos cinematográficos e fazer uma fita tão burlesca quanto a decoração kitsch de sua mãe. Mas funciona, tanto que levou 3 prêmios em Cannes este ano.

O longa é permeado por trechos de cunho documental em preto-e-branco onde Hubert fala de seu amor e ódio pela progenitora, também usa referências literárias na forma de trechos escritos na tela ao invés da narração, cenas freudianas em que corre atrás da mãe vestida de noiva, pedaços de filmes caseiros de quando era pequeno, sequencias de imagens dos acessórios e objetos decorativos da casa onde vive com ela para igualmente sobrecarregar o expectador, uma clássica cena em câmera lenta na pista de uma boate e outra de sexo, tintas e pincéis ao som de Vive La Fete. Parece muita coisa, e é, mas todos esses artifícios são muito bem executados e concedem igualmente força e beleza ao resultado final.

“Tráfico de Almas”

28/10/2009

Paul Giamatti ganhou o público dos Festivais depois de sua participação em Sideways que entre outros, conquistou no Oscar e BAFTA, prêmios de melhor roteiro adaptado. Firmou sua popularidade com os cinéfilos após protagonizar o capcioso “Lady in the Water” de M. Night Shyamalan em 2006, e parece ter gostado da experiência.

Agora, estrelando (outra) comédia metafísica, o personagem de Paul é um ator que, paralisado pela ansiedade depara-se com uma promissora empresa em pleno artigo da New Yorker, cuja auspiciosa tecnologia oferece alívio para os pesares da existência humana [a la Lacuna Inc.*].  Paul recorre ao laboratório Soul Storage, e se vê envolvido num estratagema onde sua própria alma é contrabandeada por uma atriz russa, esposa do chefe da máfia do Cold Souls“(2009).

Diretora de dois prévios curtas, Sophie Barthes faz sua estréia em longametragens após ser selecionada em 2007 para um laboratório de roteiro e direção em Sundance com o projeto deEu, Ela e Minha Alma“: que resulta no limiar do humor inexpressivo, e entre a realidade e fantasia de Barthes facilmente reconhecemos elementos de Charlie Kaufman.

Oye!

27/10/2009

Depois dos posts do “Bruce Willis do Egito” e do “Forrest Gump made in Japan”, o ator Abhay Deol de Oye Lucky! Lucky Oye! (2008) é o “Mark Ruffalo” indiano”(!)

Abhay interpreta o protagonista Lucky, figura carismática e sociavél que conquista pelo jeito simples e uma labia sempre sofisticada e afiada. Baseado na verídica história de Lucky Singh, o filme mostra a adolescencia, a tragicômico segundo casamento do pai, sua associação com o amigo Gogi numa carreira de furtos e contrabando, seu romance com a correta Sonal, suas incriveis fugas da polícia.

O plano de fundo um fictício programa sensasionalista indiano sobre grandes e controversas figuras do mundo do crime contando a trajetória dos roubos de Lucky, que termina sendo traído pelo parceiro, quando  o filme já está quase apático e os créditos finais em nada parecem com a frenesi inicial cheia de recursos, brilho e musicalidade.

Mas além do jeito doce (Mark Ruffalo) de ser de Lucky, os primeiros dois terços valem muito a pena, a começar por uma, dita, abertura inicial, uma ode a Bollywood, cores, cenários, figurinos kitsch, os acessórios mil, a trilha contagiante que faz mexer as pernas durante quase todo tempo num  ritmo ágil e caloroso do enredo, além do recurso usado duas ou tres vezes de resumir alguns acontecimentos com divertidas sequências de fotografias, que sustenta a agilidade e riqueza visual de “Oye Lucky! Lucky Oye!” .

Branco no Arroz

23/10/2009

White on Rice” é quase como um “Forrest Gump” sendo dirigido por Wes Anderson( “Rushmore“(1998), “Os Excêntricos Tenenbaums” (2001), “A Vida Aquática de Steve Zissou“(2004) e “O expresso Darjeeling“(2007).   Com o melhor dessas duas referências.

A trilha, a fotografia, a atmosfera lúdica dos filmes de Anderson são identificadas desde os créditos iniciais e sustenta ao longo do filme, que pode ser categorizado como comédia ou até comédia romântica, por tratar as personagens com delicadeza e carinho e os dramas internos nunca são explorados apelativamente, sempre muito sutilmente, mas o roteirista e diretor de “White on Rice”, Dave Boyle,  traz sim uma assinatura sua, verificada já na cena inicial com a família reunida, os lances de câmera são ‘redondos’, quase fluindo, além de ser ainda mais acentuado no pueril, e no otimismo, sem acentuar ou julgar qualquer que seja o vício de comportamento de cada personagem.

O Tom Hanks de Boyle, um imigrante de 40 anos, que após o divórcio no Japão, vai morar com a irmã e o cunhado nos EUA, dividindo o beliche com seu introspectivo e prodígio sobrinho e 10 anos. O que para o protagonista não causa nenhum ferimento em seu ego. Inocente, sonhador,  e sem finesse social alguma,  Jimmy cativa por sua pureza e espontaneidade, e igualmente diverte. O elenco todo é igualmente tratado com muito respeito e profundidade em suas ânsias existenciais.

Tradução do título à parte, “Como Unha e Carne“(2009) é um filme indie, sutil, engraçado e feito por gente grande, no que diz respeito a qualidade, conteúdo e o belo resultado.

“Ibrahim Labyad”

22/10/2009

Ibrahim Labyad”(2009) é uma experiência incômoda e ainda assim as idiossincrasias do Cairo deixa o filme muito belo. Três referências permeiam o filme, segundo longa do diretor egípcio Marwan Hamed: “Cidade de Deus”, “A Paixão de Cristo” e “Duro de Matar”. E funciona.

Como no brasileiro de Meireles, explora os desmembramentos no processo de favelização: a ilegalidade, as hierarquias particulares, a selvageria do ‘judiciário e executivo’ marginais, o protecionismo dessa população aos criminosos. Indigestas sequências de violência explícita deixam a “A Paixão..” pra trás; corpos sendo cortados, surrados, perfurados, queimados, torturados, ossos quebrados, um balé de agressões onde maior que a repulsa é o mérito pela sincronia, maquiagem e edição.  E além das ótimas longas cenas de perseguição, que são bem valorizadas na primeira parte do filme, o protagonista, um Bruce Willis ‘from’ Egito, executor e certamente alvo de tanta brutalidade, resiste sobrehumanamente. E é dito ser baseado em fatos reais (!).

O filme perde um pouco a adrenalina na segunda metade mas retoma apoteóticamente no sangrento final, a trama pode ser comparada a de uma novela, o enlance do protagonista e a canastrice na atuação do vilão por exemplo, mas sigo defendendo o “bom e bizarro” conjunto do parágrafo anterior que o Hamed integra com propriedade.

*  Marwan Hamed foi assitente dos premiados diretores egípios Samir Seif, Daoud Abdelsayed e Khairy Beshara; dirigiu os curtas Cairo (1997), End of the World (1998), Abul el Rish (1999), El Sheikh Sheikha (1999) e Lilly (2001), vencedor do prêmio do público no Festival de Clermont-Ferrand, maior festival internacional de curta metragem do mundo. Também participou do primeiro campus de talentos do Festival de Berlim, em 2003. O primeiro longa do cineasta Marwan Hamed foi considerado o filme mais caro da história do cinema egípcio. Baseado no romance de Alaa Al Aswani, best-seller no Egito, “O Edifício Yacoubian”(2006), venceu de Melhor Filme nos Festivais de Tribeca, Nova York e Montreal e, apresentado na  30ª Mostra de SP, recebeu Prêmio do Júri de melhor ator para Adel Iman. Já apresentava a temática violenta ao tratar de corrupção, sexo e tortura.

O paradoxo dos “zumbis bem dispostos”

19/10/2009

O artista plástico britânico Marc Pierce tinha uma idéia na cabeça, voluntários angariados através do Facebook, apenas uma câmera na mão ( a segunda quebrou), e o equivalente a US$ 74: “Nós compramos um pé-de-cabra e uns rolos de fita. Compramos também chá e café, para manter os zumbis bem dispostos durante as filmagens”.

Exibido durante um festival de terror no País de Gales onde seus organizadores o recomendaram para um agente, chegou com uma sessão vazia em Cannes, mas causou burburinho suficiente para uma oferta de distribuição do filme na Grã-Bretanha. Colin“(2008) mostra a perspectiva do zumbi em sua nova condição trôpega, e sua irmã, que o leva para casa na tentativa de ativar alguma memória afetiva para fazê-lo voltar ao normal.

Pierce como ator é um ótimo diretor. Isso diz quase tudo sobre o filme.   Mas as críticas, algumas cenas (realmente) sem nexo, a grande maioria delas desnecessariamente longas e monótonas, a péssima atuação generalizada (desculpe mas o ‘elenco’ faz parecer semi-impossivel recriar os trejeitos de um semimorto), parecem perder a força no momento em que se pensa dizer “eu faria melhor”: o mérito de Pierce é exclusivamente esse, ele, de fato, o fez;  bom ou ruim.

12, “o cinema é para poucos”

19/10/2009

Passado o Festival do Rio e repescagem ainda mais proveitosa, é preciso eleger o filme do Festival 2009 antes de pegar a ponte aérea para a Mostra de SP. Mais do que um filme de Festival, dificilmente perde o posto de melhor filme do ano para abonequinha:12“.

Começar dizendo que o filme do ator e cineasta russo Nikita Mikhalkov é um remake de “12 Angry Men“(1957) de Sidney Lumet é, no mínimo, reducionista. A estória é igualmente adaptada do roteiro de Reginald Rose: um jovem réu acusado de assassinar o pai num caso que parece ser de veredicto automático, logo se torna um drama pessoal de cada um dos doze jurados,  seus preconceitos sobre o acusado e uns aos outros; mas 12 (2007) não é outro senão um filme essencialmente russo:

Nikita, que atua como um dos jurados no caso de um adolescente acusado pelo assassinato de seu padrasto, um oficial militar russo que o acolheu durante a guerra da Chechenia, transpõe o cenário da sala do júri, para um anexo: o ginásio de um colégio e a história particular de cada jurado se funde na fragmentada sociedade russa dos tempos atuais.

Atual presidente da Fundaçăo da Cultura Russa e do Festival Internacional de Cinema de Moscou já se dedicava a filmes históricos na então URSS durante das décadas de 70 e 80.  Em 77 “Peça Inacabada de Piano Mêcanico” mostra o choque das Rússias monárquica e revolucionária no seio de uma família de classe média. No documentário “Anna dos 6 aos 18“(1993) filmado ao longo de 12 anos com sua filha, tem o plano de fundo a vida política soviética. Ganhou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 95 por “O Sol Enganador” em que transparecem a falência espiritual e o isolamento dos personagens refletidos em críticas sobre a modernidade e sobre os regimes políticos, seus temas constantes.

Pessoalmente, o roteiro e o enviesamento político são coadjuvantes  quando o filme, como arte, envolve pela fotografia, direção e execução esplêndidas, a beleza, a profundidade, o ritmo do filme bem dosado com flashbacks da infância do réu, são entidades universais. Eu me derreteria em adjetivos e elogios. Mas deixo para o Júri de Veneza que concedeu a Nikita um prêmio especial pelo conjunto de sua Obra em 2007, ano que  12concorreu ao Leão de Ouro:

“O Júri tem a satisfação de reconhecer o brilhantismo consistente do corpo de trabalho de Nikita Mikhalkov. Seu novo filme é mais uma vez uma confirmação da sua mestria na exploração e revelação, com grande humanidade e emoção, a complexidade da existência.”

[Alguns preferem os finais, mas o “remake” me encantou desde os créditos iniciais, ali eu já tinha me apaixonado.  E, apesar da realidade e cultura distantes e da legenda eletrônica não ser das melhores seguiram duas horas de cinefilia e deleite. No fim da sessão nem acenderam as luzes e uma dupla já palpitava essa ou aquela cena e “gostou do filme?” enquanto eu nem me mexia ainda comovida, e com os comentários mais pobres na saída da sessão como se fosse um programa de sábado a noite finalizado, sem pretensão, pensei:  “o cinema é para poucos”. ]

Distrito 9

19/10/2009

Uma nave espacial estaciona em nosso planeta e desta vez não está pairando sobre Washington ou Nova York, e sim Joanesburgo, Africa do Sul, nacionalidade do jovem diretor e roteirista Neill Blomkamp, que aos 22 anos teve indicação ao Prêmio Emmy pelos efeitos visuais na série televisiva de James Cameron:  “Dark Angel” e agora concorre com o ex-patrão em três categoria no Oscar 2010: Melhor Filme, Melhor Edição e Efeitos Visuais, além de Melhor Roteiro Adaptado.

Graduado pela Vancouver Film School em Efeitos Visuais e Animação 3D tem em seu currículo de animador o filme “3000 Miles to Graceland” e a série “Smallville” e, aos 30 anos, estréia muito bem na direção da excelente  ficção alienígena District 9 (2009)que foge dos padrões de hollywood e renova bem sucedidamente o gênero 

O filme inova já pela perspectiva documental apresentada no ínicio e a refrescante idéia de um protagonista antiherói ao invés do mocinho sobrehumano; o personagem é interpretado na medida exata pelo ator também sulafricano Sharlto Copley: Wikus Van De Merwe é um ordinário funcionário da empresa privada MNU que administra o Distrito 9: colônia cercada onde vivem os alíenigenas após serem ‘resgatados’ da nave mãe.

Após 20 anos num, bem composto cinematograficamente, processo de favelização, os depreciativamente intitulados ‘camarões’ vivem confinados neste gueto militarizado em condições precárias de moradia e higiene sujeitos a prostituição interespécimes e contrabando por intermédio de gangues nigerianas que, assim como a MNU, estão interessadas na tecnologia do arsenal bélico encontrado na nave. É neste contexto que o protagonista é exposto a uma substância desconhecida e em consequência passa a ser procurado pelo governo e, foragido, tem apenas um lugar para recorrer…


O “novo calvário” de Polanski

27/09/2009

Diretor dos clássicos: Chinatown e O Bebê de Rosemary, Roman Polanski foi levado sob custódia na Suíça por um mandado de prisao emitido nos Estados Unidos ha 30 anos atras, quando foi acusado e declarou-se culpado por tido por ter relacoes sexuais com uma jovem de 13 anos, em 1977.

Aos 76 anos, o cineasta foi detido no aeroporto, onde receberia um premio durante o Festival de Zurique. As autoridades locais sabiam que o pedido de detenção era válido e “É por isso que ele foi levado sob custódia.”, disse um porta-voz do Ministério da Justiça. O mesmo não explicou por que o diretor nunca havia sido preso antes Suíça, por onde o diretor que viveu na Polonia, ja havia passado por viagens e ate permanecido no pais.

Segundo seu advogado “ainda muito cedo para saber” se Polanski será extraditado. O ministro da Cultura francês, Frédéric Mitterrand, declarou-se “perplexo” e lamentou profundamente este novo calvário na vida do cineasta, remetendo implicitamente ao trágico assassinato de sua esposa, a atriz Sharon Tate, que estava grávida de oito meses, em 1969. Mitterrand ainda relatou que Sarkozy “está acompanhando o caso com muita atenção e partes esperam que o ministro que a situação pode ser rapidamente resolvido”.

Em comunicado, os organizadores do Festival de Zurique demosntraram sua “profunda consternação e tristeza“, e salientaram que seguirao com a planejada retrospectiva e que apresentariam o prêmio em outra data. Já a Associação dos Diretores Suíços criticou as autoridades sobre o que descreveu com “não só uma farsa grotesca da justiça, mas também um imenso escândalo cultural “.

Em 2003 , venceu o Oscar de melhor diretor por O Pianista; o premio foi recebido, em seu nome, pelo ator Harrison Ford, uma vez que Polanski nao desembarca nos Estados Unidos ha 30 anos, e tem evitado mesmo os países como o Reino Unido onde têm um tratado de extradição com os EUA.

O Informante de Soderbergh

26/09/2009

Sempre premiado, Steven Soderbergh transita com facilidade entre superproduções, filmes autorais, os sociais  “Traffic” e “Erin Brockovich“, os políticos como “Che” e “Che parte 2 “, e metalinguísticos como“Full Frontal“, assim como os também sagazes e canastroes “Ocean’s 11, 12 e 13“.

Já emThe informant!“(2009), o cineasta traz ás telas uma história verídica de Mark Whitacre, executivo de alto escalão achando que, ao denunciar a própria empresa por criação de cartel, ele ganhará uma merecida promoção, Mark acaba se envolvendo mais do que devia com FBIe sua mitomania.

O Desinformante tem um “que” de Prenda-me Se For Capaz e Queime Depois de Ler, referencias passivas e que perdem o brilho na trama, que é sim, merecidamente elogiada pela atuação de Matt Damon, não só fisicamente mas em sua contrução de um Whitacre com medidas balanceadas de ingenuidade, insegurança e cinismo.

O filme tem estréia prevista para 18 de outubro, mas pra quem não aguenta esperar pra ver Matt Damon gordo, de bigodes e peruca: o filme está na programação do Festival e tem sessões amanha (27) na Gávea (15:30 e 19hs), terça, no Cinemark Downtown e quarta no Roxy.

A casa Fantasma

26/09/2009


Baseado em uma história de Honoré de Balzac, Nucingen Haus” excessivo em estimulação pelo experimental, que marcas do prolítico diretor, a parte, beira o amadorismo por uma fotografia e edição de som novelesco, e é exatamente essa ‘experimentação’ ou ‘parece novela’ que fez do filme: a bomba desse Festival.

Raoul Ruiz nos leva à meados dos anos 30, onde um rico americano William James e sua esposa Anne-Marie, numa aposta, ganham uma bela casa muito bem localizada na beira dos Andes, mas não a encontraram vazia: entre os antigos moradores ainda estão lá: a medonha governanta Ully, o lord Bastien, a volúvel Lotte, o belo – e morto – Leonore e outros seres sobrenaturais.

A Casa Nucingen”(2008) é rotulado “horror” mas conta com um humor no mínimo peculiar,  dos diálogos à maneira com que exala o mal-estar generalizado que não demora a chegar ao expectador. Cheguei em cima da hora e o lanterninha ainda avisou “nao perdeu nada, esse filme é muito do ruim”. Estava certíssimo, só me restou criar a categoria ” Bonequinha de Carvão”.

O peixe e o Padrasto

21/09/2009


A cineasta britânica Andrea Arnold abriu a disputa pela Palma D’Ouro em Cannes 2009 com a exibição de sua melindrosa crônica adolescente e deixou o Festival dividindo o Prêmio do Júri com o padre vampiro de  Park Chan-Wook, de “Sede de Sangue”.

Fish Tank”(2009) é centrado na jovem Mia, crescida na periferia em um ambiente desestruturado e emocionalmente hostil que, acostumada a violência verbal, é surpreendida pelo mínimo de ternura que lhe prestam, acabando por despertar fascinação pelo namorado de sua mãe, interpretado por Michael Fassbender ( de “Inglorious Basterds”). No enredo, a infiltrada desconfiança e a carência afetiva são meticulosamente analisados no plano do previsível, mas nem por isso menos denso.

Arnold, que em 2006 ganhou o prêmio do júri trazendo a aspereza da natureza vingativa em “Red Road” e já havia conquistado uma estatueta do Oscar no ano anterior pelo curta “Wasp”, tem todo o mérito ao extrair deste Aquáriosutilezas e desconcertos de viés orgânico da estreante Katie Jarvis ao optar por um tratamento quase documental.

“Madeo”:Realizador de Cannes

21/09/2009

O diretor sul coreano Bong Joon-ho já conquistou seu lugar no reduto dos festivais: por “Memórias de um Assassino“, ganhou o prêmio de Melhor Direção em San Sebastian de 2003 e teve seu maior sucesso de bilheteria “O Hospedeiro“(2006), exibido naquele ano, na Quinzena dos Realizadores em Cannes.

Em 2009 assina a direção de dois filmes presentes na programação do Festival do Rio e da Mostra de SP: “Tokyo!”( http://wp.me/sCZrc-55)  e “Mother” que conta a história de Hye-ja, uma mãe desesperada ao ver seu pacato único filho emoldurado erroneamente por um crime, ela, sozinha, busca por todos os meios encontrar o verdadeiro assassino.

Mother também foi exibido na Quinzena dos Realizadores em Cannes 2009.

Mammut e o Urso

21/09/2009

A sinopse de “Corações em Conflito” é morna mas ainda sim convidativa: um jovem e rico casal de Nova York e sua filha de 8 anos;  ele, um webdesigner juntando somas de dinheiro e ela, uma cirurgiã. Ambos enfrentam dilemas existenciais: Ellen, em longos plantões médicos passa a questionar suas prioridades quando percebe que a filha prefere a companhia da babá filipina, esta, que só pensa nos dois filhos que deixou em seu país de origem; enquanto Leo, em viagem de negócios à Tailandia acabará por desencadear uma série de eventos que será dramática à todos os envolvidos.

O casal é protagonizado por jovens e renomados atores: Gael Garcia Bernal e Michelle Williams. Tudo parece normal por dois detalhes: o primeiro é a babá filipina que deixa os filhos para trás e se dedica a cuidar de outra criança por dinheiro e até onde vimos na resenha, o final não é feliz, logo retomei a memória a “Babel“, ao segmento em que o próprio  Gael Garcia participa, e ficou uma sensação de “já vi isso antes”. Mas o que não encaixa no cenário é Lukas Moodysson.

Moodysson nada mais é o responsável pelo asco “Um Vazio em Meu Coração”, um filme banal, chocante e pretensiosamente provocativo na gratuidade, que tive o desprazer de assistir no Festival de 2004. Não consigo conceber como um cineasta que escolheu o viés desnecessária e absurdamente escatológico naquele ano, conseguiu um filme que além do grande público ter estômago para assistir, pacatos e conhecidos atores aceitaram os papéis e “Mammut” levou o Urso de Ouro em Berlim este ano.

O Duque e o Tenente

21/09/2009

Herzog (“duque” em alemão),  cultuado por sua versão do clássico de “Nosferatu“, de Murnau(1922), que levou o Urso de Prata em Berlim em 79, fez mais de 30 filmes: entre os mais recentes estão: os premiados documentários “The White Diamond“(2004), “Grizzly Man“(2005), “Encounters at the End of the World“(2007), a ficção “The Wild Blue Yonder” e o filme de guerra com Christian Bale, “Rescue Dawn“.

O eclético cineasta alemão, conhecido por seus inóspitos cenários como Alaska, Vietnan, Antártica e até outro planeta, este ano nos traz Nova Orleans e retoma o gênero que o consagrou: o remake, com Bad Lieutenant: Port of Call New Orleans“.

Bad Lieutenant” de 1992 empresta o nome e um de seus roteiristas (Victor Argo) para este longa policial recheado de nomes e rostos conhecidos do grande público como Nicolas Cage, Eva Mendes, que sensatamente abraça sua personagem coadjuvante e deixa Cage dominar, o que, de fato, o faz muito bem, Val Kilmer e Fairuza Balk.

Em …Port of Call New Orleans(2009): o detetive Terence McDonagh é promovido a tenente após salvar um prisioneiro de um afogamento decorrente do furacão Katrina numa cena inicial bem canastrona e com trilha policial dos anos 90. O ato ‘heróico’ no entanto deixa seqüelas e o personagem de Nicolas Cage torna-se dependente de analgésicos. Um ano depois já não consegue deixar de confiscar para si parte das mercadorias apreendidas no exercício de sua profissão. E este seu envolvimento em atividades ilegais acaba por comprometer seus padrões morais e coloca em risco sua próxima missão.

“A Criada” de Silva

21/09/2009

Escrito e dirigido por Sebastián Silva, o filme La Nana levou dois prêmios em Sundance: O Grande Premio do Jury e Melhor atriz para Catalina Saavedra, além dos prêmios de Melhor filme nos Festivais de Guadalajara e Cartagena 2009.

O filme chileno conta a história Raquel, que depois de 23 anos à serviço da família Valdes,  sente-se usurpada quando seus patrões decidem contratar outros funcionario para ajudá-la. Raquel, então, através de travessuras infantis começa a sabotar os novos funcionários na ilusão de ser, ela, um membro da família. Apenas a última candidata, Lucy, é capaz de deslocar a protagonista de seus joguinhos de sabotagem para um momento de redescoberta pessoal. As lentes de Silva acabam por revelar a fragilidade de Raquel e vê-la evoluir é comovente.

Em A Criada, o diretor procura examinar, nesta complexa dinâmica familiar, a intercecção das forças social e pessoal que resulta numa incômoda, mas envolvente comédia dramática que abala e humaniza este insidioso resquício empoeirado da divisão de classe latinoamericana.

O Clone e o Gêmeo

19/09/2009

Os filmes da Mostra MIDNIGHT sempre aguardam um público de mente mais aberta, digamos assim. As temáticas são as mais variadas do bizarro, ao fantástico passando pelo trash, absurdo e ficçã o, que é o caso de ” The Clone Returns Home“(2008).

Com o enredo de um astronauta que participa de um programa de clonagem  experimental  acabando por embarcar numa fatal missão espacial, tem seu “clone” ativado. Até aí tudo bem, mas ao encontrar o corpo de sua “matriz”, o clone retoma à memória um trauma de infância: a perda de um irmão gêmeo, e pensa então, estar diante do falecido irmão. O ciclo clone-irmão-falecido-outro clone pode por a perder a apreciação da luxosa fotografia fria.

O longa, nomedado ao Grande Prêmio do Júri em Sundande 2009, tem como produtor executivo, Wim Wenders dos cultuados “Buena Vista Social Club“, “Hotel de Um Milhão de Dólares” e “Paris, Texas“, por exemplo.

Woodstock 2009

18/09/2009

Ang Lee que já teve uma midnight session no Festival de 2007 com “Lust, Caution”, este ano, retorna ao Odeon com toda pompa e circunstância através da   exibição de gala de seu novo filme, que marca a abertura do Festival Int’l de Cinema do Rio de Janeiro 2009.

Aconteceu em Woodstock” foi escolhido pela efeméride dos 40 anos do maior evento do rock e “por tratar de um assunto relacionado à construção e realização de um sonho. Isso tem muito a ver com o espírito do nosso evento“, nas palavras da diretora executiva do Festival, Ilda Santiago.

O filme, baseado na história real de Elliot Tiber e sua família, Taking Woodstock(2009) tem atmosfera da ida do homem a Lua, da ideologia hippie, de uma geração que nasce num quintal, que em nada se parece com os tons pesados e a viés melindrosa de “Desejo e Perigo“, a não ser pelo plano de fundo: a Guerra do Vietnã, e, segundo o próprio Ang Lee, ambos também refletem seu desejo de testemunhar o mundo em quem que vive.

Moda a Meia-Noite [2]

17/09/2009

O diretor estadunidense R.J. Cutler, vencedor do Emmy de Melhor Reality Show por American High (2000) e indicado ao Oscar de Melhor Documentário por”The War Room” (1993), nos apresenta, sob o slogan “Fashion is you Religion, This is your Bible“:  “The September Issue“(2009), filme que mostra os bastidores da edição mais concorrida da revista Vogue.

Além da monossilábia diretora executiva, Anna Wintour, a diretora-criativa Grace Coddington responsável pelo fantásticos editorias “que tem a intenção de ser um conto de fadas e fazer a pessoa sorrir e sonhar” coprotagoniza o filme, mostrando diferenças contrastante na personalidade das duas diretoras que, curiosamente, entraram para o staff da Vogue no mesmo dia.